Ana, Eric e sua música que chega na gente de um jeito bonito Divulgação / Lindsay J. Ralph

Ana, Eric e sua música que chega na gente de um jeito bonito

Dia desses, o tempo me atropelou e nem deu tempo de anotar a placa. Passou tão rápido que eu nem vi, enquanto eu atravessava a rua. Saltei de uma calçada ainda menino, segurando firme a mão enorme de minha avó, cercado de amor, e cheguei ao outro lado sozinho, envelhecido e tristonho.

Meu ouvido zumbindo, minha vista embaçada, meu coração partido e minhas saudades ficamos ali, sentados no meio fio, mirando o passado do outro lado da rua.

E então uma canção caiu sobre mim, sobre nós, como a chuva que cura a terra seca e a enche de vida e beleza.

I could see our house from here I could see it crystal clear…

Era um casal mocinho cantando lindo, que me abraçou e me pôs de pé. A canção se chama “I can see our house from here” e está no primeiro álbum da dupla Ana&Eric, dois brasileiros construindo uma vida bonita num país estrangeiro.

Seu disco “Our House From Here” tem nove canções, ora cantadas em inglês, ora em português, misturando folk, bossa nova, música popular brasileira, rock’n roll, new wave, pop, como numa espécie de galeria vintage de um tempo bonito que retorna feito um presente.

Ana&Eric
I Can See Our House From Here, do duo Ana & Eric, lançado pela gravadora canadense The Citadel House

Ana&Eric fazem música que chega na gente de um jeito bonito. Dá vontade de dançar na cozinha, esquentando a comida, batendo bolo, fazendo chá, mas é mais do que isso. Seu disco tem canções que ajudam a gente a levantar da cama e fazer o que há por fazer. Ajudam a gente a seguir adiante com o que temos, do jeito que der, até que tudo melhore por nosso empenho e por nossa conta.

Parece pretensioso, mas ouvindo as canções da Ana e do Eric eu consigo enxergar todas as suas referências, feito olhar para dentro de um rio e enxergar cada peixe e cada planta, e as pedras coloridas, e os filhotes de sapo. E a vida inteira correndo ali.

Fico suspeitando seus heróis, seus modelos e suas esperanças. Joni Mitchell? Belle & Sebastian? Everything but the girl? Bob Dylan? Não importa. É tudo muito bonito. A beleza está ali. Há sempre uma canção de amor conspirando pelo bem da gente. Sempre uma música de alegria acordando belezas dentro de nós.

Eu já ouvi o disco de Ana&Eric algumas vezes. Estou ouvindo agora, enquanto olho para o outro lado da rua. Descobri que eles estão no Brasil fazendo shows e penso em vê-los de perto. Feito um adolescente dos anos oitenta, quero ser amigo deles, montar um fã-clube. Achei bonito. Viajei no tempo com eles. O mesmo tempo que me atropelara parou um instante. Voltou para ver se eu estava bem. Está tudo certo. E seguiu adiante. Vamos em frente.

André J. Gomes

É professor e publicitário.