Segure os nervos e as gargalhadas! Thriller que acaba de chegar à Netflix vai te fazer pular de susto enquanto ri Divulgação / Netflix

Segure os nervos e as gargalhadas! Thriller que acaba de chegar à Netflix vai te fazer pular de susto enquanto ri

Dirigido por Wisit Sasanatieng e escrito por Abishek J. Bajaj, “Quem Matou?” é um misto de comédia e suspense produzido pela Netflix e o primeiro de sua coleção em dialeto Isan, cuja etnia se localiza no nordeste da Tailândia. Dividido em capítulos e em ordem não cronológica, o enredo segue as investigações do massacre a uma família que mora em uma região rural do país. Os acontecimentos que levaram ao crime são desdobrados conforme as pessoas envolvidas dão seus depoimentos ao delegado Nawat (Phetthai Vongkumlao), um investigador experiente mas não muito competente, que está convencido de que o assassino é Earl (James Laver), o marido britânico de Sai (Eisaya Hosuwan), parente de vários dos mortos.

As implicâncias de Nawat com Earl se dão por sua xenofobia, alimentada por uma experiência não muito agradável com um estrangeiro branco no passado (não se sabe se sua história é verdade ou mentira) e alguns outros preconceitos não muito bem-desenvolvidos (ou muito claros) na trama. Conforme as pistas levam para a incriminação de Earl como assassino, seu desespero e o de June aumentam, já que a pena pelo crime é a de morte. Os depoimentos levam para diferentes versões da mesma história que confundem o espectador e adicionam elementos de humor e mistério à produção.

Com cenas de violência explícita e muito sangue, o enredo persegue uma sucessão de acontecimentos infelizes que resultam na tragicomédia. A cada momento, uma interpretação do crime é contada por um narrador diferente e é importante saber que absolutamente nenhum deles é confiável. Nenhum testemunho representa a verdade absoluta, nem mesmo a mentira. Com muito suspense, flashbacks e uma trilha sonora que aumenta a tensão, misturando até mesmo um terror sobrenatural, a trama dá uma série de voltas e reviravoltas absurdas e que poderiam ter sido inventadas por mentes distorcidas e criativas como a de Chan-wook Park ou os irmãos Ethan e Joel Coen, de tão originais e bizarras.

Cada consequência é resultado das péssimas decisões dos personagens, que têm suas intenções constantemente mal interpretadas. Enquanto repassamos pelos inúmeros pontos de vistas (equivocados, paranoicos e até cheios de misticismos) das testemunhas, nos aproximamos dos fatos, mas não de uma realidade. Há uma genialidade quase infantil em toda a construção da narrativa, que torna essa comédia de horrores extremamente interessante e fascinante

Com uma paleta ultracolorida e contrastada, a fotografia dá a sensação de estarmos alucinando ou de estarmos assistindo a uma fantasia. De fato, os depoimentos parecem mesmo ter saído de algum surto psicodélico coletivo. O roteirista de “Quem Matou?” costura críticas perspicazes e discretas ao machismo estrutural e oferece para cada um de seus personagens masculinos uma nuance caricaturada, um traço tóxico de um tipo de personalidade misógina. Os homens são idiotizados sem que a mensagem seja explícita ou forçada demais.

Um diálogo entre donas de casa justifica o fato de as mulheres de sua comunidade se casarem por interesse financeiro, afinal, os homens também só estão em busca uma “funcionária” que vá cuidar deles quando eles estiverem velhos demais e não darem conta nem mesmo de se limpar, diz uma personagem.

“Quem Matou?” é um filme de várias camadas e, sem dúvidas, há de existir mais comentários sociais nas entrelinhas a serem observados. Ele pode até ser uma comédia pastelão despretensiosa para uns, depende do seu dia, humor e disposição, mas para quem sabe observar, é uma obra que tem muito mais substância para oferecer.


Filme: Quem Matou?
Direção: Wisit Sasanatieng
Ano: 2023
Gênero: Comédia / Suspense / Policial
Nota: 8/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.