Achado precioso: a joia romântica na Netflix que você precisa descobrir hoje! Jacob Yakob/LD Entertainment

Achado precioso: a joia romântica na Netflix que você precisa descobrir hoje!

Os transtornos mentais ainda são tabus, embora atualmente se possa falar deles de uma forma mais aberta, leve, honesta e bem-humorada. Esses distúrbios são assunto sério, mas não tratar deles sempre de forma tão dura e careta nos dá a oportunidade de ver as coisas de forma um pouco menos pesada ou negativa.

Ansiedade, depressão, TOC, psicopatia ou sociopatia, bipolaridade e outros transtornos já foram abordados de diversas maneiras no cinema. Em “Palavras nas Paredes do Banheiro”, de 2020, o cineasta alemão Thor Freudenthal nos dá um olhar sensível, empático e menos estereotipado sobre a esquizofrenia. A história é inspirada no romance homônimo de Julia Walton.

No enredo, Charlie Plummer interpreta Adam, um adolescente no último ano do ensino médio, que é expulso da escola após ter um surto psicótico dentro da sala de aula. Aceito em uma escola católica no meio do ano, ele tem oportunidade de terminar os estudos e ingressar na tal sonhada aula de gastronomia. Seu sonho é ser chef, mas a descoberta da esquizofrenia coloca em risco seus objetivos.

No banheiro da escola, as paredes são rabiscadas com os segredos dos alunos. Lá ele encontra Maya (Taylor Russell) pela primeira vez, uma garota inteligente e cheia de personalidade, que ganha dinheiro fazendo trabalhos escondidos para outros colegas. A conexão entre Adam e Maya é quase que imediata. Adam precisa melhorar suas notas para poder formar, então contrata a garota para lhe dar aulas particulares.

Com o passar dos dias, ele e Maya se tornam cada vez mais íntimos. No entanto, há segredos entre os dois que custam ser revelados. Maya não conta para Adam que sua família passa por dificuldades financeiras e, por isso ela aceita correr o risco de ser expulsa da escola por fazer os trabalhos dos outros alunos. Já Adam não revela à garota que sofre de esquizofrenia. Enquanto isso, ele toma um remédio, cujos efeitos adversos inclui a perda do paladar. Com isso, sua habilidade de cozinhar é afetada.

Se sentindo vazio e frustrado com as reações ao remédio, ele esconde da família que abandonou o tratamento. Claro, isso não tem como acabar bem, afinal, as vozes e alucinações retornam e começam a provocar situações perigosas e constrangedoras. Apenas quando Maya presencia um episódio é que ela descobre sobre o distúrbio de Adam.

O filme se desenrola como se Adam estivesse narrando os eventos para seu psiquiatra. Por diversas vezes, ele adota um tom compassivo e engraçado diante de situações que são assustadoras e desconcertantes. E é tratando o protagonista como um garoto comum, sem nada de realmente especial, além de sua habilidade para cozinhar, que o filme traça o perfil de seu protagonista. É um enredo que não retrata um esquizofrênico como um gênio ou como um serial killer e isso é respeitoso, refrescante e significativo.

As alucinações e a noção de que não há cura para um distúrbio tão sério continua sendo aterrorizante, mas é a sutileza com que a história é contada e com que Adam encara seu problema que nos faz olhar para o personagem como alguém com quem nos identificamos. Alguém que podemos nos colocar em seu lugar.

Com ajuda da fotografia de Michael Goi, podemos mergulhar nas profundezas das emoções do protagonista, porque a câmera se esgueira por cantos, se contorce, faz o efeito vertigo e pega ângulos incômodos e incomuns, o que nos faz sentir, em alguns momentos, como se estivéssemos dentro da mente de Adam.

Maya, o nome da garota por quem ele se apaixona, é um tanto sugestivo, já que seu significado é “ilusão”. Mas ao contrário de suas visões, Maya é a única coisa verdadeira com a qual Adam se conecta. O amor não pode o salvar de sua doença, mas pode ajudá-lo a não ficar à deriva, não se perder completamente da realidade.

Em casa, o padrasto e a gravidez inesperada da mãe o fazem se sentir como um aborrecimento, um incômodo no qual sua família precisa se livrar. Seus diálogos com a mãe e o padrasto são extremamente comoventes  e deixam uma pedra na garganta do espectador.

Uma comédia romântica dramática inteligente, terna e adorável, a história de Adam pode fazer muitos adolescentes e jovens com transtornos mentais se sentirem menos deslocados do mundo. São necessárias mais obras com um olhar tão carinhoso sobre o tema.


Filme: Palavras nas Paredes do Banheiro
Diretor: Thor Freudenthal
Ano: 2020
Gênero: Romance / Comédia / Drama
Nota: 9/10

Fer Kalaoun

Fer Kalaoun é editora na Revista Bula e repórter especializada em jornalismo cultural, audiovisual e político desde 2014. Estudante de História no Instituto Federal de Goiás (IFG), traz uma perspectiva crítica e contextualizada aos seus textos. Já passou por grandes veículos de comunicação de Goiás, incluindo Rádio CBN, Jornal O Popular, Jornal Opção e Rádio Sagres, onde apresentou o quadro Cinemateca Sagres.