Se você está na fase dos 30, seja bem vinda ao clube das insatisfeitas

Se você está na fase dos 30, seja bem vinda ao clube das insatisfeitas

Aniversários não trazem apenas mais velas para o nosso bolo. Além de algumas rugas, do corpo que já não é mais o mesmo, impreterivelmente a gente vai ficando mais pesada. Sim. Cheias de tudo, abarrotadas de coisas que não nos servem e daquilo que carregamos sem entender por quê. É como puxar um carrinho de supermercado que não é nosso. Vamos entulhando pessoas que foram embora das nossas vidas, mas que permanecem dentro de nós. Relações furadas, expectativas frustradas, sonhos que ficaram no último lugar da fila, enquanto poderíamos — como as senhoras desmemoriadas que esquecem os seus carrinhos — sair do mercado sem pagar. E também sem levar nada. Justo, pois.

Há uma determinada fase em que tudo começa a pesar, cansar, irritar. Pior que não há um prelúdio, um sinal amarelo piscando, recobrindo a atenção sobre o que vem pela frente. Então chegam as intermináveis contas e prestações a pagar, os contratos a cumprir, as multas, o imposto de renda, o aluguel. Aperta a necessidade de tirar férias do planeta Terra, inclusive de si mesma, porque com o tempo passamos a nos aturar menos e, menos ainda, as outras pessoas. Começam a pesar as baladas, o sexo por instinto, o papo furado de quem não quer saber dos nossos problemas, de quem só quer saber dos próprios problemas, os problemas do mundo, os amigos de fachada, e uma cambada de gente vazia. Tudo isso oprime. E como.

Se você está na fase dos 30, seja bem-vinda ao clube das insatisfeitas, inconformadas, questionadoras, que não se suprem com o pouco e que o muito lhes parece praticamente inatingível. Eu não sei o que acontece nesse período das nossas vidas. Deve ser que exigimos muito, de todo mundo e de nós mesmas.

Antes era tudo tão singelo… Não era preciso muita coisa para ser feliz. Conseguir emprego, ter um namorado legal, bonitinho e de boa família, viajar de ônibus com uma mochila e cinco mudas de roupa. Agora queremos nada mais, nada menos, que O EMPREGO, o namorado lindo, inteligente, romântico, que fale sobre Sartre e nos recite Neruda. Que seja cinéfilo, fã dos Stones, que entenda de vinhos e cozinhe maravilhosamente bem. Queremos um homem culto que nos leve para jantar e também pelo mundo afora — de avião, por supuesto.

Nos despedimos do vigor dos 20 e das sucessivas festas, das dezenas de amigos, do otimismo ingênuo, da utopia de que iríamos mudar o mundo e do prisma de que o mundo é uma farra interminável. Deixamos de acreditar no “felizes para sempre” e no mito do príncipe encantado montado em seu cavalo branco. Mulheres de 30 já se decepcionaram tantas vezes com tantos cavalos… Até que algo sobrenatural aconteça, nada nos fará abrir as portas de casa a qualquer andarilho.

Você já reparou que até os 20 nós só olhávamos adiante? Éramos feitas de presente e futuro. Mas agora é diferente. Chegou o momento em que começamos a olhar para trás e fazer comparações com o antes e o hoje. Havíamos planejado um horizonte que não encontramos. E agora? O primogênito que chegou sem programar ou o filho programado que nunca veio. O casamento que acabou ou que acabou antes de começar. O emprego dos sonhos, o reconhecimento e a riqueza foram substituídos pelo trabalho de subsistência, a insatisfação e a falta de perspectiva.

Mas será que tudo está perdido? Qual é a medida entre ambicionar de menos e contentar-se de mais? O ideal é frear os impulsos de uma perfeição quimérica e exigir moderadamente de si e do outro. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra.

Já sei. Vou pôr no carrinho a leveza dos 20 e a segurança dos 40. Os 30 serão apenas a travessia entre um corredor e o outro. Nada mais que isso. Sem excessos, sem sobrecarga e sem inutilidades. Pagaremos a conta pelo que já consumimos. E pronto. É hora de descartar as amarguras e seguir menos pesada os passos dessa dança nossa de cada dia.

Feliz trinta e tantos. Com mais uma vela, algumas rugas e mais sabedoria.

Karen Curi

é jornalista.