Bula de Filme: Terra Selvagem, do diretor Taylor Sheridan Divulgação / Wild Bunch Germany

Bula de Filme: Terra Selvagem, do diretor Taylor Sheridan

Assisti ao filme “Terra Selvagem”, do diretor Taylor Sheridan. É um grande filme. Brutal! “Lobos não matam cervos azarados. Eles matam os fracos.” Essa não é uma filosofia dos índios nativos americanos, figuras centrais da trama de Sheridan, mas a voz da experiência do caçador de predadores vivido por Jeremy Renner. Ótimo, a propósito! “Terra Selvagem” é um faroeste moderno, que não bebe na fonte dos Irmãos Cohen, mas é carregado de ótimas cenas, texto bem elaborado e fotografia primorosa. Vacila pouco, tem pequenos escorregões, beira o moralismo, mas a mensagem, sem ser afetada ou piegas, é bela e perfeitamente entregue em seus 107 minutos de duração.

A neve, densa e alvíssima, o frio absurdo e a desolação são os violões, para além de homens preconceituosos e brutos. O mundo à margem é um treinador de humanos obrigados a viver com a perda. A violência, somada à morte precoce, de duas jovens, em diferentes momentos na cronologia do filme, são os motivos para a busca por equilíbrio e redenção. No deserto invertido, do Wyoming, onde existem apenas “a maldita neve e o maldito silêncio”, a morte de uma jovem nativa, uma mulher índia, não pode ser declarada como assassinato, pois o infortúnio tem causa no frio e na fragilidade dos pulmões sob baixíssima temperatura e, por conta disso, a justiça só pode ser feita no velho estilo do oeste: com as próprias mãos.

Cory Lambert, o caçador de predadores, entendeu muito cedo que é um sobrevivente do mundo afastado em que vive e sobrevive. É um elemento do caos. Um vetor que faz a diferença, pois representa, em sua atividade, a ordem. Caçar, significa manter a subsistência possível. Ele se junta a Jane Banner, agente do FBI, inexperiente, mas perspicaz, para investigar da morte da garota índia. O que parece sem sentido e absurdamente improvável, ganha entendimento com a experiência de Cory, e seu “faro” aguçado, que conhece cada metro quadrado daquele deserto branco de gelo e abandono.

Com frases marcantes, direção firme e atuações excelentes, Sheridan constrói um clássico menor, porém importante. Um faroeste sombrio, com suspense e drama na medida certa. Tudo num mundo frio e afastado, onde os sobreviventes não contam com a sorte para seguirem suas vidas e enfrentar seus destinos. O que resume o que vemos e, se é possível sintetizar sua mensagem, são palavras elaboradas como um resumo de gerações de clássicos do faroeste: “A sorte não costuma morar aqui. A sorte mora na cidade. Não aqui. Aqui você sobrevive ou se rende. Pronto”.


Solemar Oliveira

Doutor em Física, professor universitário e pesquisador com trabalhos publicados em periódicos acadêmicos nacionais e internacionais. Também atua como prosador, poeta, crítico e ensaísta. Autor dos romances “Desconstruindo Sofia” e “A Confraria dos Homens Invisíveis”, além do livro de contos “A Breve Segunda Vida de uma Ideia”, destacado entre os melhores de 2022. Seu livro “As Casas do Sul e do Norte”, publicado pela editora da Revista Bula, recebeu o prêmio Hugo de Carvalho Ramos, uma das mais tradicionais láureas literárias do Brasil.