Meninas e meninos eu li “A Curiosa História do Editor Partido ao Meio na Era dos Robôs Escritores”, do espanhol José Luis Saorin. Fiquei com preguiça de escrever a resenha e terceirizei para o Chat GPT fazer. Infelizmente, o texto ficou superficial, monótono e cheio de informações erradas. Tive que fazer eu mesmo. Se décadas e décadas lendo e assistindo ficção científica me ensinou alguma coisa foi que não se deve deixar uma máquina realizar o trabalho sujo de um homem e não há trabalho mais sujo do que escrever crítica literária.
Tematicamente, “A Curiosa História do Editor Partido ao Meio na Era dos Robôs Escritores” é um livro absolutamente contemporâneo, a despeito de ter sido lançado em 2004. Trata-se de uma sátira ao mundo corporativo, com tintas de intriga policial e algumas pitadas de comédia de erros. O protagonista é um editor que se vê obrigado a posicionar-se frente à nova estratégia comercial do conglomerado editorial para o qual trabalha: usar robôs, ou inteligências artificiais para bons entendedores, para escrever livros em escala industrial, deixando para os autores apenas a incumbência de assinar as obras, emprestando verniz humano, ou humanoide, ao produto final. Uma reflexão ácida sobre o sentido da arte e sua comercialização. Ainda há espaço para criatividade e talento? Uma máquina pode emular de maneira satisfatória criatividade e talento? Estilo faz diferença ou basta narrar, indo do ponto A ao ponto B do enredo, sem grandes atropelos ou experimentalismos? O objeto livro vai sobreviver?
José Luis Saorí, usando as ferramentas da ficção, especulava como poderia ser o futuro. Ocorre que o futuro chegou. E não tem muito estilo. Os robôs estão por aí escrevendo e prometem ocupar uma grande fatia da indústria editorial, acadêmica, imprensa e redações escolares sobre férias na casa da vovó. Será?
O que deu para perceber até o momento é que a inteligência artificial ainda não é uma inteligência de verdade, entendendo inteligência como sendo algo inseparável de algum tipo de senso crítico. A inteligência artificial disponível no mercado representa, basicamente, a sapiência média de seus programadores, incorporando inclusive seus preconceitos, juízos de valor e visões políticas. Sabemos que nem todos os programadores estão na esfera dos gênios, como Bill Gates ou Steve Jobs. Essa observação contém ironia.
Seja como for, ainda não estou muito preocupado com os desdobramentos da ação das inteligências artificiais em geral, e do Chat GPT em particular. Escrevem? Sim, escrevem. Mas a produção é tão medíocre e sem sabor que, talvez, possa até gerar o efeito colateral de revalorizar os textos realmente criativos e originais escritos pelos bons e velhos seres de carbono. Posso ser um otimista, mas prefiro esperar o que o futuro reserva antes de começar a gritar que é o Apocalipse e que o fim está próximo. Só vou começar a me preocupar de verdade quando a Sky se fundir com a Net.
Livro: A Curiosa História do Editor Partido ao Meio na Era dos Robôs Escritores
Autor: José Luis Saorin
Tradução: Luis Reyes Gil
Páginas: 242
Editora: Relume Dumarã
Nota: 8/10