Imagine uma senhora bem humilde, nos seus 75 anos, que já passou pela viuvez, e, depois, perdeu um filho em um acidente de trânsito. Recentemente, ela começou a fazer faxinas para ajudar a pagar o tratamento da doença do seu outro filho. Em seu sorriso cansado, você enxerga dor, muita dor. Dói-lhe o diabetes descompensado, a falta de dinheiro e a incerteza de um futuro. Em seus olhos profundos, atrás da cortina do seu sofrimento, você tenta imaginar como são as feridas que sustentam a alma dela, lembrando-lhe que desistir não é uma opção.
Foi com essa sensação que, certa vez, conheci uma mulher e sua filha com sequela de paralisia cerebral. A menina, na sua pequena cadeira de rodas, sorria para mim de seu mundinho particular. O cuidado carinhoso da mãe e a limitação da garota apertaram o meu coração, que se expandiu quando a mulher falou que aquela criança era uma benção na sua vida. Um amor sem limitações: “minha filha me ensina a ser uma pessoa melhor a cada dia”.
Outro dia, li uma reportagem em que um casal adotou um gato sem uma perna. Após um ano procurando, os pais viajaram até outra cidade para buscar o bichinho de três patas que se tornou o melhor amigo da filha, uma menininha que sofrera a amputação de um dos braços por causa de um câncer.
A vida perfeita é uma ilusão. Percorremos descalços pela estrada de paralelepípedos desalinhados da nossa existência: os pés machucam, e sangram; desistem, e param. Mas seguimos o caminho porque as cicatrizes nos mostram que ainda suportamos. Cicatrizes não são lembranças da morte, elas são as marcas de nossos milagres.
Stephen Hawking nos ensinou que não importa o quanto a vida pode parecer ruim, sempre existe algo que possamos fazer, e conseguir. Tomemos como exemplo a história de vida dele e olhemos para as batalhas internas de cada um de nós. Ainda, abracemos todas as nossas imperfeições e dores e buracos negros, e sigamos o conselho desse grande físico: “lembrem-se de olhar para as estrelas lá no alto e não para seus pés lá embaixo”.
Parece inexplicável a força do ser humano que surge através do caos, do medo e da dor. É como tentar entender a teoria de como o universo começou e se ele é infinito ou não. Entretanto, sabemos que o mais profundo sofrimento faz nascer esperança: não temos certeza de nada, mas acreditamos que estamos aqui por algum motivo.
É assim que olho para o casal que não conseguia ter filhos e adotou duas irmãs doentes; e para o paciente idoso que é acompanhando em todas as consultas médicas pelo vizinho, um moço que fica sensibilizado pelo velho que não tem parentes e mora só.
A nossa alma é pesada como um barco que afunda e leve como a borboleta que flutua. Somos um universo de aprendizado em expansão, mesmo quando não compreendemos de onde vem essa força, vontade e alegria de viver. E mesmo que os nossos passos sejam doídos pelos caminhos tortuosos da vida, ainda podemos endireitar o nosso olhar: sozinhos, podemos; juntos, conseguimos.