Reza assim o meu canteiro, ainda a ser cultivado — se tudo correr bem, será por mim beatificado: Metas para o ano que se inicia. Salvar um leão por dia. Matar a saudade com requintes de humanismo. Nadar, nadar, nadar e renascer numa praia, como um homem livre. Ler um livro de poesia por mês. Entregar amor no atacado. Comer o pão que a vovó amassou. Afundar uma nova igreja, com as bênçãos de Deus. Deificar o sol, num rompante saudosista; vê-lo nascer quadrado na janela do quarto da moça que ressona ao meu lado. Morrermos felizes para sempre, como o trema. Divagar em busca da perfeição de vagar, numa paz extrema, devagar e sempre, sem me perder em dilemas. Fazer faxinas na casa da mãe Joana. Sorrir pelo leite derramado das tetas de uma mulher que me alimenta pelos olhos. Deixar para a manhã o que se pode protelar hoje. O ontem ninguém sabe. Lambuzar-me de vida. Passar mel na cara da morte. Decepcionar doenças. Encontrar o que eu não mais procuro. Tatear pela paz no escuro. Semear ventos. Colher um toró de ideias alvissareiras. Desandar sem eira nem beira. Vender conselhos com o pagamento em pudins. Topar o sol com uma peneira e me deixar aquecer com o seu brilho milenar. Brilhar por aí, por dentro e por fora, feito um vagalume. Alumiar a solidão de um velho. Rejuvenescer os sonhos. Recauchutar a memória. Ajudar Judas a encontrar as suas botas. Dar um basta aos preconceitos. Bater continência para a lua. Extrair o rei da barriga com cólicas de laxativos. Deixar a vida terminar em pizza, sem melindres cognitivos. Chorar as pitangas com a Camila Pitanga. Sair à francesa, usando um pretexto mais que perfeito: conhecer Paris. Ser feliz, sem ressalvas.
Anotai as metas para o ano novo nas pétalas de uma rosa
Eberth Vêncio
É escritor e médico.