Alexandre Frota, a falência do Forrest Gump brasileiro que era, deixou de ser, foi de novo e hoje quem sabe? Michel Jesus/ Agência Câmara

Alexandre Frota, a falência do Forrest Gump brasileiro que era, deixou de ser, foi de novo e hoje quem sabe?

David Bowie, Michael Jackson, Christian Bale, James Bond e dr. Lao são conhecidos como verdadeiros camaleões humanos. Cada um deles metamorfoseou-se inúmeras vezes em nome da arte. Essas mudanças, geralmente, faziam parte de atuações performáticas, muitas vezes radicais ou mesmo fatais. Michael Jackson, por exemplo, chegou a se transformar em outra pessoa, muito mais feia e menos talentosa. Nessa pequena coleção de exemplos, a vida imitou a arte. Porém, com Alexandre Frota — sim, Ele mesmo — o buraco é bem mais embaixo.

Alexandre Frota é pau para toda obra, já fez de tudo um pouco e um pouco de tudo: ator, diretor, pornógrafo, funkeiro, humorista, empresário, jogador de futebol americano no Corinthians, marido da Cláudia Raia, marido da assistente de palco do Milton Neves que ficou em segundo lugar no Concurso da Nova Loira do Tchan, motorista de Uber e até BBB sem ter passado pelo BBB propriamente dito. Sentou-se no banco da Praça é Nossa e só não ganhou um Troféu Imprensa porque na época o referido prêmio era monopolizado por Fábio Júnior. Explorando o efeito Tiririca, foi eleito Deputado Federal na eleição de 2018, surfando como bom menino do Rio na onda conservadora que varreu o Brasil. Entrou rasgando no Congresso Nacional como situação, mas mudou de posição e tornou-se oposição em tempo recorde. Passou quatro anos entrando e saindo de comissões. Considerado traidor do movimento (salve, salve João Gordo), não foi reeleito em 2022. E agora, José? Veremos, não perca o próximo capítulo.

Alexandre Frota se reinventa a cada ciclo lunar. Não só como artista, não só como personalidade, não só como celebridade, mas como ser humano (como ser humano?! Duplo sentido intencional?). Alexandre Frota é uma espécie de Thundercat de sunga Bad Boy, um felino gigante vivendo no Terceiro Mundo e dono de sete vidas. Sete ou mais. Todas elas acompanhadas pela nação brasileira, hora com curiosidade, hora com desprezo, hora com nojinho, hora com inveja, hora com ódio. Alexandre Frota é o Forrest Gump brasileiro. Não é por acaso que quando Ele usava a camisa 77 do time de futebol americano Corinthians Steamrollers (rollers?!) todas as vinte e cinco pessoas que lotavam as arquibancadas gritavam em uníssono: “corra, Frota, corra!”. 

As origens da lenda são obscuras. O arqueólogo dr. Henry Jones Júnior afirma ter encontrado em Búzios restos frotianos que datam do período pré-Bardotiano. H. P. Lovecraft anotou em seus diários que consta nas páginas do “Necronomicon” que Alexandre Frota nasceu no Rio de Janeiro em 1963. Considerando que Lovecraft morreu em 1937, o que temos em mãos é uma profecia com o tempo verbal desconexo. Mas tempo verbal nunca foi uma preocupação para Frota. Eu acredito no Necronomicon, sobretudo considerando que não me lembro de um tempo em que não existisse Alexandre Frota. Pode ser minha idade, mas não descarto a possibilidade de que Frotinha seja um tipo de entidade cósmica lançada na Terra com objetivos misteriosos, um arauto de Galactus com sotaque carioca, um Cthulho tatuado, um ser atemporal. Flagelos como Gengis Khan e Rasputin seriam proto-Frotas preparando a humanidade para chegada do Frota Prime. Por essa lógica, Alexandre Frota não é, nem está, Frota flui pelo rio da existência. Não como um barco, mas como uma frota, uma frota de navios piratas.

Jorge Luis Borges afirma que duas páginas perdidas do “Livro de Areia” tratam de uma batalha ancestral pelo amor de uma deusa de coxas grossas e pelo destino da humanidade: a Frotamaquia, também conhecida como Guerra dos Frotas. Aconteceu um pouco depois da Titanomaquia, o conflito entre os Deuses Olímpicos e os titãs, e um pouco antes do lançamento do disco “Titanomaquia” da banda Titãs do Iê-iê. O violento combate foi travado no alto do Pão de Açúcar entre duas entidades: Marcos da Lua de um lado e Alexandre Grandão do outro. Ambos Frotas. Esse confronto foi uma verdadeira novela. Sassarica para cá, sassarica para lá, Alexandre Grandão finalmente venceu. Derrotado e com sérias lesões cerebrais, Marcos exilou-se em uma praia distante, onde passou o resto da eternidade gaguejando augúrios obscuros e esculpindo mulheres de areia. Outra versão da lenda afirma que ele fugiu com o circo.

Vencedor, o prêmio de Alexandre foi ganhar um avatar de carne, osso e proteína compactada, reencarnando no núcleo espírita da Rede Globo de televisão, mais precisamente no elenco de Roque Balboa Santeiro, onde teve o privilégio de testemunhar a única boa interpretação da carreira de Mauricio Mattar, como João Ligeiro. Daí em diante estavam abertos os portais da glória. Participou de clássicos como “As aventuras de Sérgio Mallandro” e “Os Bons Tempos Voltaram: Vamos Gozar Outra Vez”, obra que, embora seja difícil acreditar, não pertence à fase pornográfica de sua carreira. Mas nada de ficar fazendo piadinhas com a carreira dramática de Alexandre Frota. Ele estrelou a refilmagem do clássico “Matou a Família e Foi ao Cinema”, dirigido pelo artista performático descolado Neville d’Almeida e escrito pelo papa dos cinéfilos cults brasileiros, Júlio Bressane. Supere isso, Ian McKellen!

Por falar em Ian McKellen, Alexandre Frota já foi um ícone da comunidade gay. Seus ensaios fotográficos para revista “G Magazine” marcaram época, só rivalizando em charme e elegância com a edição estrelada por Vampeta. Sua vanguardista atuação ao lado, atrás e na frente da simpática travesti Bianca inspirou outros “Fenômenos” da mesma natureza. Hoje, Frota é odiado pela militância LGBT, mas é preciso reconhecer sua contribuição na luta contra o preconceito. Não pode ser esquecida sua autodeclarada fake News de que teria sido amante do deputado federal conservador Marco Feliciano. Há alguns anos, Frota pediu desculpas para o deputado, que, gentilmente, aceitou. Tornaram-se amigos de anos. Apenas um grande homem tem coragem de voltar atrás e Frota voltou atrás muitas vezes.

Mas o tempo passou e Frota passou o rodo no tempo. Cheirou e renasceu das cinzas, como pode ser verificado em sua biografia “Identidade Frota — A Estrela e a Escuridão”, escrita por Pedro Henrique Peixoto, lançada quando completou 50 anos de idade e outros tantos dilacerados. A obra é um clássico da dicotomia. Se antes Frota pedia mais misses, depois passou a pedir menos Marx e mais Mises. Se antes Frota tinha na ponta da língua Rita Cadillac e Márcia Imperator, depois passou a trazer na ponta da língua citações certeiras à queima roupa dos filósofos Roger Scruton e Olavo de Carvalho. Tornou-se um dos mais influentes intelectuais de direita brasileiros. Chegou a protocolar pessoalmente um pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, com a palavra impeachment escrita corretamente. Não que a vida nas altas esferas do pensamento seja uma novidade para Ele. O livro “Do Outro Lado do Muro”, escrito em parceria com João Henrique Schiller, sobre sua passagem pela Casa dos Artistas do SBT, mostra uma foto do Frotinha lendo “Estação Carandiru”, de Dráuzio Varela, o clínico geral das estrelas. Silvio Santos aprovou e consta que, para reviver a velha parceria, cogitou a possibilidade de convidá-lo para dirigir a nova temporada da comédia de costumes “A Semana do Presidente”. Infelizmente, as negociações não foram adiante. Frota, então na condição de deputado federal, assim como seu amigo Marco Feliciano, estava muito ocupado com os debates sobre o movimento Escola Sem Partido. Debates que não frutificaram. Um pouco porque Marco Feliciano não se dá bem com frutos do bem e do mal, um pouco porque Frota entende mais de partidas do que de partidos.

Mas se um movimento é pouco e três é demais, Frota, conhecido por ser uma pessoa de muitos movimentos, desejou possuir pelo menos dois. Entrou numa querela judiciaria pela posse legal do nome MBL, Movimento Brasil Livre. Frota disputa com Kim Patroca Kataguiri, quem tem o MBL maior. Apesar das origens nipônicas de Patroca, a internet ficou dividida, mas mamãe falou que com Frota não só o movimento é sexy como o movimento não fica parado. Não sei se houve alguma decisão do juiz. Ninguém se importa mais com o MBL. Muito menos eu, para me informar sobre o assunto. Seja como for, se perdeu a causa, será apenas mais uma injustiça na vida de nosso sofrido personagem.

Muitos acusam Frota de oportunismo, de não ter o direito de se tornar conservador e religioso em função de seu passado não indicado para menores. Mas esses detratores precisam se lembrar de duas coisas. Primeiro: Frota participou de uma temporada da “Malhação”, o que significa que já passou um tempo no purgatório e pagou seus pecados. Segundo: a tradição cristã ocidental festeja libertinos arrependidos ou que sofrem em êxtase sexual místico, indo de São Francisco de Assis, passando por Santa Maria Egipcíaca até chegar na doutora da Igreja Santa Tereza D’ávila. Portanto, se Frota for mesmo um pecador arrependido e seu detrator um moralista hipócrita que julga os outros sem se dar conta do cisco no próprio olho, é bem provável que o primeiro esteja mais próximo da santidade do que o segundo.

No Brasil, atirar a primeira pedra em plena Quarta-Feira de Cinzas é tradição nacional. Mas, com trabalho e paciência, é possível construir um muro com as pedras que nos são atiradas. Conhecendo os hábitos eleitorais brasileiros, analisados detidamente pelo cientista político Edson Arantes do Nascimento, prevejo uma carreira política brilhante para Frota, a despeito de não ter sido reeleito em 2022. Acontece nas melhores famílias e Frota tornou-se um homem de família, pelo menos até segunda ordem. A Câmara Federal foi apenas o primeiro passo. O lendário presidente americano Camacho lhe é uma inspiração. Não duvidemos que em alguns anos Frota dispute a faixa presidencial. Com chances reais de vitória, apesar da rejeição atual. Se Ele for preso, como a história mostra, suas chances duplicam.

E Ele pode ser preso a qualquer momento. A nova história do contador de histórias é a seguinte. Frota teve a falência civil decretada pela Justiça em função de suas dívidas impagáveis, somando cerca de R$ 1,2 milhão com o Banco Econômico S/A. A dívida começou com gastos de 88 mil no cheque especial e, somando juros, multas e correções monetárias acumuladas desde 2006, tornou-se esse show do milhão. Justo, considerando que, durante a pandemia, Frota foi partidário da política da “economia a gente vê depois”. O depois chegou.   

Importante lembrar que contribuiu para a derrocada financeira de Frota dois processos judiciais que perdeu para o cantor francês Chico Buarque e para o desembargador federal Rogério Favreto. Frota falou demais, pagou para ver, começou a ver como fazia para pagar e, por fim, pediu arrego. Sem patrimônio, com o nome no SPC, sem a vitória eleitoral de Ciro Gomes, sua única saída foi pedir autofalência. Pediu e recebeu. Sua insolvência foi decretada pelo juiz da 3º Vara Cível do Foro da cidade de Cotia. Não me pergunte qual influência Frota possui nesta Vara em específico, não tenho essa informação. Só sei que foi assim.

O que vai acontecer? Os credores vão recorrer? Frota Gump vai correr? Frota pode ser preso? Frota vai dar a volta por cima, como sempre fez em sua carreira? Tudo pode acontecer em se tratando de Frota, inclusive Ele se tornar o diretor presidente do Banco Econômico S/A. Veremos.

O fato é que Alexandre Frota é o Clóvis Bornay do ódio. É hors-concours. A moda agora é odiar Lula e / ou Bolsonaro, Neymar tem seus momentos, mas toda a grande nação brasileira separa um espaço sombrio em seu coração para odiar Frota. Todos amam odiar Frota. Provavelmente, até seus eleitores o odeiam. O voto em Frota foi diferente do voto em Tiririca. Quem votou em Tiririca a primeira vez foi como se votasse no Macaco Tião para prefeito do Rio de Janeiro. Quem votou em Tiririca a segunda vez não entendeu a piada. Mas quem votou em Frota foi além. Quem votou em Frota queria foder com tudo. Frota é como Wolverine, Ele é o melhor naquilo que faz, mas o que Ele faz não é nada agradável. Frota sabe qual é o negócio.

Ademir Luiz

É doutor em História e pós-doutor em poéticas visuais.