Subitamente, numa dessas reviravoltas malucas da vida, vocês agora se encontram distantes. Estabeleceu-se uma ponte interestadual — ou, pior, intercontinental! — entre seus corpos, e um dolorido hiato agora os separa de forma cruel. As pessoas ao redor, em sua grande maioria, ficam perplexas com o fato de vocês terem decidido manter-se juntos, a despeito de todas as forças contrárias. “Isso não dá certo”, “amor é convivência”, “ninguém aguenta ser fiel a distância” e tantos outros comentários pouco agradáveis passam a ser parte do dia a dia, colaborando com a nada confortável sensação de vazio que agora preenche o coração.
Relacionamentos a distância são complicados e exigem muito comprometimento das partes envolvidas. É como elaborar um cuidadoso contrato e confiar em sua execução, sem garantias reais, a despeito de tantos advogados do diabo a insistirem que se trata de uma ação perdida. Quem vive essa situação tem duas escolhas: ou se sucumbe ao ceticismo, ou se lança em alto-mar. Aos que escolhem tentar, a prova é árdua, mas há de trazer alguns pontos interessantes.
Os amantes a distância se tornam absolutamente hedonistas: cada segundo da presença do outro é sagrado, intenso e absoluto. Agem como se não houvesse amanhã, pois de certa forma estão sempre se despedindo, mesmo no instante em que se reencontram. A certeza do contato breve faz com que pensem dez vezes antes de provocar algum desentendimento, criando uma saudável peneira de maturidade e sintonia.
Amantes a distância são criativos e se reinventam o tempo todo. Procuram as mais diversas demonstrações de amor, dedicam-se a cartas longas (elas ainda persistem!) e a surpresas que causem um sorriso terno, imaginável a milhares de quilômetros. A internet torna-se forte aliada, assim como os pacotes telefônicos, os aplicativos de mensagem e a câmera do celular. Compartilhar virtualmente as pequenas coisas do dia a dia é como contar ao outro que ele está sempre presente. Em tempos de tecnologia avançada, não é a ausência física do corpo que vai afastar a determinação da alma.
A falta do outro deixa espaços vazios, que podem ser incríveis oportunidades de autoconhecimento. Há certa poesia no vazio, na contemplação, na quietude do espírito. Compreende-se que, estando perto ou longe um do outro, a descoberta interior é uma jornada solitária. Nesse momento, entende-se que estar com o outro é uma opção e ter a si mesmo, antes de desejar ter alguém, é a única chance de ser voluntariamente enlaçado por algemas de asas.
Essa jornada de autoconhecimento ajuda a controlar o ciúme, mas, como ninguém é de ferro, talvez seja um dos maiores problemas de estar longe de quem se ama. É preciso aprender a confiar, é preciso aprender a acreditar. É preciso aprender a conversar um papo reto, sem rodeios, saudável e sem melindres. “Vou tomar uma cerveja com meus amigos” há de significar exatamente isso. Qualquer espaço para a paranoia desmedida é uma porta escancarada rumo ao fracasso. Se bem desenvolvida, a confiança talvez seja o maior trunfo dos casais fisicamente distantes. Manter-se como casal, mesmo que um oceano tente separá-los, é escolha que não aceita meios termos. É venda casada: só dá certo quando existe confiança.
Por incrível que pareça, relacionar-se a distância pode ser uma forma interessante de conhecer o outro e o perfil do relacionamento em si. Intimidade e cumplicidade vão encontrando formas alternativas de se manifestar que provavelmente não existiriam caso o contato fosse diário. Nada como sair da zona de conforto para descobrir quem é quem. Se o negócio funcionar, é provável que seja de outras vidas.
Há várias formas de distância. Alguns dividem conta, feijão e cama, mas deixam que um abismo os separe. Outros dividem esperança, saudade, força de vontade e, mesmo nadando contra a maré, podem se amar com sucesso. O amor é a força mais potente que há no mundo. De cabeça erguida e olhos abertos, vocês finalmente compreendem: a ponte que liga dois mundos de forma mais eficiente é o coração.