A história se move como num pêndulo em que, como bem observa aquele velho barbudo, seus fatos e personagens mais importantes não se repetem, mas respeitam uma ordem quase invariável, em que despontam uma primeira vez como tragédia — argumento que sempre se pode contestar em alguma medida. Se algum episódio superficialmente parecido toma corpo e ocupa o palco dos eventos cuja relevância determina os rumos de uma nação inteira, são decerto acompanhados por um andamento farsesco, marcado por uma glória quimérico, que fede à utopia mais rasteira, além de obscurantismo e mistificações de toda sorte. A humanidade é tão pouco coesa, o homem é tão pouco constante, o mundo é tão caótico; a alma de cada homem, em maior ou menor proporção, é tão repleta de demônios, silenciosos ou estridentes, pacificados ou sempre dispostos a tentar uma próxima cartada, que continuamos irredutíveis naquele que parece ser nosso projeto maior: ser nosso próprio lobo, avançar sem qualquer traço de razão sobre os desejos que não podem e não devem se realizar, ratificando o fundamento mais básico presente no pessimismo e no niilismo dos filósofos que ensinam que o homem está irremediavelmente desnorteado porque não sabe o que querer da vida, esse mistério cada vez mais indecifrável à medida que passa nosso próprio tempo e o tempo histórico, mais e mais desvairado e mais e mais resoluto em sua marcha homicida para a insensatez.
Quanto mais rico é um país, mais inimigos atrai para si, voluntária ou involuntariamente. É o poder é quem dá as cartas em quase todas as relações humanas, e como droga perigosa que é, tem efeitos colaterais arrebatadores. Ninguém questiona a verdade de que a democracia é um mecanismo muito bem azeitado, composto de avanços e retrocessos, e seu funcionamento depende em larga medida da capacidade que seus líderes precisam ter quanto a colocar em prática a autoridade de que lhes reveste o cargo que ocupam em nome do povo. Todavia, o que deveria ser um capital a ser invejado por todas as civilizações ao redor do mundo torna-se, contrariamente, motivo de ataques que não raro degringolam nas mais variadas modalidades de barbárie, espraiando-se de um a outro polo do globo.
“Olympus Has Fallen” (2013) explora essas e muitas outras questões acerca da condução da política internacional dos Estados Unidos, mormente as que tocam à defesa do território e da soberania americanos, e Antoine Fuqua tem bala na agulha quanto a levantar argumentos sólidos, ora notadamente retóricos, ora dotados de uma tomada de posição corajosa frente a um assunto que passou à ordem do dia na América desde os atentados de onze de setembro de 2001, na imprensa, entre os políticos e, por óbvio, junto às Forças Armadas. A obra de Fuqua se destaca por mesclar produções voltadas à fantasia àquelas flagrantemente satíricas de eventos reais, por mais que, mesmo nesses casos, a narrativa aponte para um encadeamento pleno de afetações semânticas e de estilo.
Apesar das duas horas, o roteiro de Creighton Rothenberger e Katrin Benedikt não se dá a muitas circunvoluções descritivas. Olympus é o código fictício com que a CIA e o FBI, o serviço secreto americano, se refere à Casa Branca, a residência oficial do presidente americano. Objetivo já no título, o filme explicita que alguma coisa vai mal no edifício mais vigiado e, pretensamente, mais seguro do país. Aaron Eckhart desempenha como poucos esses papéis de tipos engravatados metidos a contragosto numa cilada qualquer — como se verifica em “Sully: O Herói do Rio Hudson” (2016), de Clint Eastwood. Benjamin Asher, sua versão para o mandatário maior da América eclipsa tanto a performance de Gerard Butler como Mike Banning, o malsucedido candidato a herói da trama, como a do veterano Morgan Freeman na pele do porta-voz Trumbull, ambíguo, para dizer o mínimo.
“Olympus Has Fallen” segue como o esperado, com uma boa reviravolta da passagem do segundo para o terceiro ato, quando do surgimento do núcleo de terroristas norte-coreanos — por aí já se prevê o rumo dessa prosa. Fuqua entrega um filme denso e tenso até o fim, embora, frise-se outra vez, carregue nas tintas do discurso ufanista. Mas isso é só cinema, certo?
Filme: Olympus Has Fallen
Direção: Antoine Fuqua
Ano: 2013
Gênero: Ação
Nota: 8/10