Thriller político de ação da Netflix é o melhor filme de 2022 até agora K. Kourtrajme / Netflix

Thriller político de ação da Netflix é o melhor filme de 2022 até agora

A Revolução Francesa pode ter sido burguesa, mas necessitou do apoio da massa, mobilizada pela fome e pelas injustiças sociais, para se tomar as devidas proporções. E os franceses sabem muito bem como se mobilizar radicalmente contra as autoridades. Nos livros de história, nos noticiários da televisão e nos filmes vemos como o espírito aguerrido da nação está sempre pronta para se levantar contra situações que considerem injustas.

Em “Athena” temos um levante de centenas de jovens que moram em um complexo habitacional de Paris após um adolescente de 13 anos, de origem argelina, ser morto por policiais. No filme de Romain Gavras, que remete ao contexto de “La Haine” ou “O Ódio”, filme de 1995 de Mathieu Kassovitz, protagonizado por Vincent Cassel (o mesmo de “Irreversível”), onde um jovem muçulmano também é morto por policiais.

Mas se “La Haine” se passa 24 horas após a revolta popular, acompanhando três jovens rebeldes perambulando pela cidade. Em “Athena” o que se explora é o próprio conflito. No filme de Gavras, a tensão se inicia nos primeiros minutos de filme, que foi filmado em apenas um take de mais de 10 minutos, sem cortes. E é chutando portas e sem sutilezas que o filme de ação captura o espectador logo no começo.

Um longa-metragem breve, de apenas 90 minutos de duração, “Athena” é cheio de raiva, ação, intensidade e caos do início ao fim. Trágico, bárbaro e incômodo como um pigarro na garganta, ele segue dois irmãos, Karim e Abdel, que tem opiniões divergentes sobre como reagir à morte do irmão caçula, de apenas 13 anos. Abdel é um militar condecorado, que serviu à França no Mali e quer aguardar que a justiça seja feita pelo próprio sistema do país. Karim, por outro lado, reúne centenas de jovens em Athena para vingar a morte do irmão. E eles declaram guerra às autoridades com um coquetel molotov lançado no departamento de polícia, enquanto a imprensa está no local gravando entrevistas.

As cenas que se seguem são de perseguição, da polícia sitiando o complexo habitacional e de muito confronto. Gavras, que é diretor de comerciais de televisão e videoclipes, como o “Bad Girls”, da rapper M.I.A., sabe como pintar esteticamente a tela e oferece belas cenas de explosões, fogos de artifício e combates. Uma cena específica em que um grupo de policiais invadem o condomínio e são cercados pelos jovens, mostrando um verdadeiro espetáculo pirotécnico que mais parece uma imagem de cometas atravessando o espaço, é particularmente hipnotizante.

Mas não é apenas a estética que fala. A história é bem escrita e faz sentido, apesar de não haver tantos diálogos ou discussões. Em um momento, a imprensa cogita que o adolescente pode ter sido morto por um grupo de extrema direita fantasiado de policiais. Mas os guerreiros de Athena, que estão mais para espartanos, querem o pescoço do culpado na guilhotina.

Com uma câmera nervosa e cenas longas, o filme teve apenas 163 cortes, para dar uma sensação ao espectador de que caminha pelos corredores incendiados do condomínio sem piscar os olhos. A trilha sonora funciona bem para amplificar o teor dramático das imagens.

Uma ópera sobre a polarização política, a violência policial, o racismo e as desigualdades sociais, “Athena” mostra o crescimento de Gavras como cineasta em sua terceira experiência em longas-metragens e oferece ao espectador um filme de ação com substância e uma mensagem importante social a se pensar sobre, como diria Hannah Arendt, a banalização do mal.


Filme: Athena
Direção: Romain Gavras
Ano: 2022
Gênero: Thriller/Ação
Nota: 10/10