Uma explosão de felicidade: ah, quem nos dera! É o que merecemos neste momento

Uma explosão de felicidade: ah, quem nos dera! É o que merecemos neste momento

No final do século passado, foi quando vieram a público as primeiras imagens ao vivo de implosões de edifícios, pontes, viadutos, estádios de futebol, conjuntos habitacionais e até de bairros inteiros, ao deixarem de ser necessários ou mesmo viáveis. Hoje, no entanto, é cena corriqueira e quase ninguém liga. Mas, quando começou, era capaz de mobilizar a atenção do povo e provocar discussões acaloradas, como o desempenho dos times de futebol e o impeachment de governantes fracassados.

Pode parecer uma contradição em termos, mas implosão é, na verdade, uma explosão que combina, com rigor técnico, o volume da massa do objeto a ser demolido, a quantidade necessária de explosivos e o comportamento dos destroços perante a lei da gravidade. O objetivo é detonar a coisa e fazer com que, pelo seu próprio peso, caia sobre si mesmo, num monturo, sem espalhar estilhaços. É uma explosão pra dentro: implosão. É um efeito alcançado pela justa medida.

Para que uma edificação seja implodida, várias providências, além das relacionadas à massa da coisa e o volume de explosivos, são tomadas previamente. Dentre elas a colocação de tapumes e amortecedores das ondas de choque, a evacuação do imóvel e dos arredores. É preciso retirar antes todos os bens de valor e depois certificar que não resta ninguém, animais de estimação ou da fauna local. Se houver um ninho de sabiá, por exemplo, com ovinhos ou filhotes ainda implumes, o órgão ambiental pode embargar a obra. Ou melhor, a desobra. Já baratas, cupins, ratos e escorpiões, ninguém liga. Pode detonar.

Nosso Brasil varonil passa por um momento de edifício que perdeu a viabilidade. Uma gangrena política, que ninguém dá jeito, está levando ao apodrecimento econômico, ao encolhimento do PIB, com repercussões sociais devastadoras: emprego em queda, produtividade em baixa, dólar nas alturas, infra-instrutoras em ruínas, esperanças mortas e perspectivas turvas. E o marasmo econômico realimenta a gangrena política. É tanta autoridade comprometida com a podridão ética que não restou um segmento sequer com legitimidade e honradez para tomar o timão do barco, retirar do círculo vicioso e tocar a viagem. A coisa não tem saída à vista. Uma explosão de felicidade: ah, quem nos dera! É o que estamos merecendo neste momento. Mas, mesmo contra nossos desejos e necessidades, a nação corre o risco é de sofrer uma implosão sem precedentes. Risco dos explosivos da corrupção detonar e os escombros do país imenso cair sobre si mesmo, num monturo medonho, com entulhos horríveis para serem removidos por décadas e décadas sem parar.

Se a implosão vier a ocorrer, será sem os rigores técnicos. Sem os devidos controles que a boa técnica de implosão requer. Pela magnitude dos explosivos e pela massa do objeto, estilhaços poderão escapar e atingir os edifícios vizinhos e uma onda de choque gigante provocará danos planetários, em dimensões imprevisíveis. Não haverá como retirar os bens previamente, evacuar a área, retirar as pessoas e os animais de estimação. Nem retardar a implosão por causa dos ninhos dos sabiás ainda com filhotes.

Teremos que nos virar e sobreviver à implosão. Dentro dela. Teremos que nos arranjar em meio aos escombros, por entre os entulhos resultantes. Nesse cenário de apocalipse, lamentavelmente, as baratas, os cupins, os ratos e os escorpiões políticos terão uma imensa vantagem competitiva em relação à nossa pobre espécie que, por ironia, se autodenomina de Homo sapiens.

Edival Lourenço

Escritor.