Ninguém ama para sempre. Eu te amo hoje. Amanhã a gente vê como que fica

Ninguém ama para sempre. Eu te amo hoje. Amanhã a gente vê como que fica

Não, não é você. Pode acreditar. O problema é comigo. Eu que sou insatisfeita, exigente, descrente. Eu que não gosto de andar de mãos dadas, não sou de demonstrar carinho. Diferente da música, eu não sei namorar. Não durmo de conchinha. Não pergunto como foi o teu dia e torço para você não me contar os teus problemas. Não rendo, não ligo, não respondo. Mas, olha, não tem nada de errado contigo. Você é maravilhoso, gentil, inteligente, divertido. Gosta de mim. Eu que sou esquisita mesmo. Não quero nada além do hoje, muito menos para sempre. Eu quero é ser feliz agora.

Não, eu não sou uma herege no amor. Até acredito no amor, como acredito na magia do Natal, mesmo sabendo que Papai Noel não existe.

É que o amor nunca vem sozinho — e esse é o problema. Ele traz junto o peso do “para sempre”, e confesso, isso me rouba o ar dos pulmões. Me agoniza. Porque para sempre é muito, mas muito tempo mesmo. Você não acha? Isso não te assusta? Como eu posso saber o que vou querer daqui há 40 anos, se minha comida preferida será a mesma, se o Cristo Redentor ainda estará de braços abertos, se eu vou aguentar a sua voz ou se não vou mais suportar o teu perfume?

Meu Deus, me ajude. Será que ninguém pensa como eu?

Como prometer uma felicidade a prazo? Como pagar o amor em parcelas intermináveis? E se a relação der defeito, se espatifar e não tiver conserto? Continuamos quitando as parcelas de um amor que não funciona mais? Complicado isso, minha gente.

Aí, depois, vem a culpa, se amontoando em cima das nossas costas. Pesada. Incômoda. Perturbadora. Porque o que era para somar acabou subtraindo. Nos dividimos mais uma vez em parcelas. Das duas, uma; ou nós culpamos o outro por tudo que deu errado, ou a gente se culpa pelas coisas que não deram certo.

Resumo da ópera: o amor chega trazendo a ilusão de que ele é interminável. As pessoas se embrenham nessa ideia e não conseguem viver nem um dia sequer sem planejar um futuro entrelaçado. Por que não começar um convívio sem a pressão para que dê certo, sem a menor certeza, sem nenhuma promessa? O que mata o amor é, justamente, a obrigatoriedade de ser feliz a longo prazo. Por que sempre tem que ser assim, começar o amor com o peso de ser eterno?

É por essas e outras que eu não rendo. Porque quero ser feliz hoje sem a necessidade do compromisso estipulado, firmado e testemunhado.

O problema não é você, encantador e envolvente. Sou eu, questionadora, reflexiva, ressabiada. Não me venha com promessas de que seremos felizes para sempre. Porque é mentira. Ninguém é, e nem será, eternamente feliz ao lado de outra pessoa. Não chegue assumindo responsabilidades que não lhe pertencem, nem traçando planos a dois que eu não queira ser parte.

Se é pra ser feliz, eu quero ser agora. Se você quer me fazer feliz, não me sufoque com eternidades efêmeras. Vamos esgotar todos os milésimos de segundo hoje. E amanhã? Bom, amanhã é outro dia. Amanhã a gente vive tudo outra vez.

Karen Curi

é jornalista.