A não ser que o trem saia dos trilhos mais cedo, amigo, você terá que passar pela vida, por esta vertigem, este sopro desenfreado, esta roda imprevisível.
Esse percurso será revestido de sua cara, marca e assinatura. Ao fim, restará um rastro nos que ficam, nas coisas tocadas, no vento que carrega as palavras ditas e no peso do silêncio das que não foram.
O caminho é seu. Ele pode ser insosso, obrigatório, arrastado, preto e branco, só preto, só branco e você, só um passante. Ou pode ser intenso, colorido e você, o melhor dos hedonistas modernos.
Embora a tendência do homem seja esperar por grandes milagres ou mudanças estrondosas, a maior parte das alegrias advêm de momentos simples, que preenchem o cotidiano a espalhar leveza e prazer: uma música, um filme, uma palavra, um livro, um diálogo, um abraço, um doce e tantas coisas miúdas que, de tanto existirem, muitas vezes passam batidas.
Uma música pode-se apenas ouvir e deixar passar, mas pode ser visceral também. Essa variação depende apenas de quem a ouve, pois que ela será o mesmo conjunto de notas para todo e sempre. Um trabalho pode ser um trabalho, os dias, apenas dias, os passos, apenas passos. Mas tudo pode convergir numa sinfonia fluida, se houver permissão para que seja o caminho desenhado.
Por isso, esteja presente em si mesmo enquanto vive. Não sobrevoe o presente a sonhar com o futuro, corroer o passado, ou entregar-se a lamentações pela vida que não tem. Mas, pior, não se torne mais um zumbi vagando adormecido sem nada sentir, compondo um grande saco desalmado de carne e ossos imprestáveis. Você já está aqui, faça direito.
Por mais óbvio que possa parecer, tudo o que se tem agora é o AGORA. Esteja presente com a alma rendida e entregue, com profundidade e consciência da vida que permeia seu sangue, do milagre que é viver cada segundo. Esteja onde você está.
Então, não tome um vinho, TOME O VINHO. Não trabalhe, TRABALHE. Não ouça uma música, OUÇA A MÚSICA. Várias vezes, cem vezes até que aquilo o arranque da dormência e faça nascer um sorriso de orelha a orelha apenas por estar vivo.
Se algo der errado, apenas pense que da crise literalmente nasce a ruptura, a decisão. Abrace a raiva e a frustração com a mesma intensidade de todo o resto. Apenas dê a esses sentimentos um lugar passageiro, no qual só sobre espaço para a “krisis”, a oportunidade de bem decidir. Os gregos sabiam o que diziam.
É isso, amigo, para ser grande, é preciso ser inteiro. Pôr quanto se é no mínimo que se faz e carpe diem.
*Título tomado de empréstimo de Tati Bernardi.