O pioneiro “Viagem à Lua” (1902), de Georges Méliès, mesmo com toda a despretensão, amadorismo e frugalidade técnica de seus 18 minutos, intrigou a sociedade da época e enlouqueceu muita gente, também pelo ineditismo do que se tinha ali: uma outra realidade exposta numa tela grande por meio de um projetor. A Bula escolheu cinco exemplos de filmes que podem até não ter como propósito primeiro deixar ninguém encafifado, mas que a mufa sai chamuscada, sai. A lista não obedece a critérios de classificação. Assista, reflita e vamos trocar uma ideia.
Imagens: Divulgação / Reprodução Netflix
Quem gostou de “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” vai aprovar o filme de Kaufman, adaptação do romance de estreia do escritor canadense Iain Reid sobre uma mulher que depois de seis ou sete semanas quer terminar o relacionamento, mas mesmo assim aceita viajar para conhecer a fazenda dos pais do namorado, o que vai fazê-la repensar muitas coisas, o que suscita um fluxo de pensamentos monomaníacos que incluem, sim, romper com o parceiro, mas sugere também mudanças muito mais profundas.
Em “O Discípulo”, o diretor indiano Chaitanya Tamhane examina a vida de um artista em formação. O jovem Sharad Nerulkar quer se aperfeiçoar no raga, a música erudita da Índia, uma manifestação artística, mas também uma prática que visa a alcançar a elevação do espírito. Sharad busca ser o melhor em seu ofício, estudando as lições de uma grande cantora lírica indiana, que deixou apenas uma gravação de seu trabalho.
Em tempos de insegurança crítica que beira a paranoia, o longa de Andrew Niccol expõe um tema intrigante. No filme, um sistema de vigilância extrema liquidou qualquer hipótese de se burlar a lei. Até que um detetive encontra uma mulher responsável por uma grande descoberta: uma falha nesse super Big Brother que põe a perder a ordem social. Voltando ao começo desta resenha, o tema é intrigante porque fica a reflexão: até que ponto é válido se deixar persuadir pelo discurso da intervenção do Estado na intimidade do cidadão comum.
Em “Tempo Compartilhado”, dois homens unem forças para resgatar seus familiares de um lugar paradisíaco quando ficam convencidos de que um conglomerado americano quer expulsá-los dali. Uma crítica acerba à indústria de sonhos artificiais consumidos sob a forma de férias perfeitas por uma sociedade hedonista, ávida por prazer a qualquer custo. Neste terror nada convencional, a ação sucede à luz do surrealismo, ou feito uma comédia bizarra, que provoca risos involuntários.
No segundo longa de Charlie McDowell, estão em tela os dramas de uma sociedade perdida, cansada e obcecada por algum alento. A possibilidade concreta de prolongamento da vida após a morte, comprovada pelo cientista Thomas Harber (Robert Redford) leva muita gente a cometer suicídio. Ele não se acha o responsável nem parece sentir remorso pelos milhões de mortos e quer divulgar ainda mais sua grande descoberta. Entretanto, uma entrevista ao vivo o convence de que seu experimento carece de ajustes.