Não são nada incomuns histórias de mulheres que denunciam homens de dopá-las e abusá-las sexualmente. Enquanto esses casos se tornam públicos, as mulheres acabam novamente vítimas, desta vez, de julgamentos precipitados por boa parte das pessoas, desconfianças, humilhações e exposição na internet, adjetivos depreciativos e uma mancha em sua história difícil de apagar, além do trauma pessoal. A mulher nunca está certa, nem mesmo quando tem razão. Nem mesmo quando é vítima.
Versão espanhola de 2020 da série homônima inglesa, de 2017, “Mentiras”, de Curro Novallas e Norberto López Amado está disponível na Netflix. No elenco, Ángela Cremonte interpreta Laura, uma professora de literatura, que acaba de romper um relacionamento de longa-data e aceita sair com o médico-cirurgião Xavier, vivido por Javier Rey. Ele é pai de um de seus alunos do ensino médio e já há tempos demonstrava interesse na professora. No restaurante, eles se dão bem e compartilham uma garrafa de vinho. No fim da noite, vão para a casa dela. O problema é que ela acorda com poucas lembranças do que houve na noite anterior e muita ressaca. Acreditando ter sido drogada e violentada, Laura presta queixa na polícia.
Os eventos que se seguem são um tanto quando revoltantes, já que Xavier demonstra surpresa e indignação com as acusações. Para todos, é mais fácil acreditar na versão do médico, já que o fato de ser homem e médico lhe confere muito maior credibilidade. Sem ter como provar as acusações, Laura, de vítima, se torna a vilã, que não tem confiança da polícia e muito menos de sua comunidade. Até que consiga se provar certa, a professora tem sua versão rechaçada.
Embora o roteiro provoque no espectador muito mais simpatia pelo agressor que pela vítima, as boas atuações fazem a série valer a pena. Uma boa opção para maratonar no final de semana, “Mentiras” traz reflexões necessárias sobre o machismo institucionalizado e enraizado na sociedade.