Duas solidões se encontraram num desses acasos da vida. Uma esquina qualquer, o caminho de sempre na volta cansada de um dia de trabalho monótono. O ritmo monocórdio que ecoa nas rádios da avenida. Livros e sacolas de feira, papéis timbrados, papéis de bala. A velha certeza de que o amor é para os outros, menos pra você, acabou despencando no chão e rolando ladeira abaixo. Reconheceu instantaneamente naqueles olhos o lugar aonde queria estar. E ficar. E não ter que ir embora.
Em outras palavras, o cupido te acertou em cheio quando menos queria ou esperava. Nocaute. Você mal conseguiu pensar ou se mover. Encontrou em outro sorriso a alegria que ficou perdida tempos atrás. O coração, depois de tanto apanhar, bateu forte como há tempos não fazia.
Admita. O amor lhe caiu muito bem. Deixa de coisa e assuma logo de uma vez que nem todos são iguais e que agora será diferente. Você que pensava que o coração tinha o lado certo e o lado errado, consentiu com a evidência de que o amor não é apenas preto e branco e suas nuances. Ele vai do bege ao vinho tinto, passando por tons pastéis e fluorescentes.
Esqueça o tradicional estereótipo, a velha fórmula que funciona igual para todos. Fique sabendo que o amor não é genérico. O meu não é o mesmo que o seu. Entenda uma coisa: não existe certo ou errado, feio ou bonito. Amor é amor. E pronto.
Ninguém ama igual, de um mesmo jeito. Cada ser humano nos toca de uma maneira e nos preenche de uma forma. Somos variáveis, pendemos com os momentos e as circunstâncias. O que vale é se permitir sentir e ser cada um do seu jeito, ser verdadeiro com o sentimento que trazemos dentro do peito.
Que importância faz o exterior quando por dentro temos todos as mesmas entranhas? Que diferença faz a cor da pele e as vestimentas que cobrem um corpo como o meu, como o seu? Somos todos corpos, somos todos sangue, ossos, músculos, órgãos. Sentimos igual, queremos igual, com a mesma ênfase e intensidade. Desejamos, cuidamos, amamos nas mesmas proporções. Porque somos humanos. Porque somos feitos da mesma matéria. Porque o coração que bate aqui, bate aí, bate lá, nele, nela, em todo mundo.
Dos amores que vão e daqueles que ficam, permanece a certeza de que amamos um ser e não um gênero. Admiramos, estimamos, respeitamos, nos queremos bem. Amar é isso. Vem de dentro para fora e não de fora para dentro.
Que o amor seja assumido e sentido sem culpa ou mordaças. Que seja abrangente e que acalente os corações. Que os passos cambaleantes se firmem com a segurança e a esperança de um mundo igual para mim e para você. Que o amor possa ser motivo de orgulho, de força maior e razão para a cura de todos os males.
Se o amor é eterno, eu não sei dizer. Pode ser que ele se transforme, que se renove, que ele se perca na mesma esquina aonde foi encontrado. Me basta a certeza de que ninguém é igual à mim e que o amor é igual para todos.
Ilustração: Elena Romanova