O grande Paulo Francis costumava dizer que “os filmes brasileiros são uma porcaria, mas os diretores são geniais”. Frase controversa que talvez se encaixe melhor na franquia Matrix, na qual três entre quatro filmes são uma porcaria, mas as diretoras são geniais.
Neste espírito chiclete com banana, misturando o cinema de Hollywood e o cinema tupiniquim, a Revista Bula, em um esforço patriótico, sai em defesa da coisa nossa. Provamos que nossos “cineastas geniais” produziram muitos filmes superiores ao projeto de blockbuster da Lana, que jogou na lama os esforços da Lily, que na próxima reunião familiar vai ter o prazer de dizer: “eu avisei”.
Para saber os motivos da bronca da Lily, assista o vídeo linkado neste artigo.
Mas o fato é que poderíamos escolher 1000 filmes brasileiros, ou 100, mas ficamos apenas com dez, para não humilhar muito.
O segundo longa-metragem baseado nas aventuras de Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali. Precisa ser citado primeiro por ter sido lançado na mesma temporada, mas principalmente porque conseguiu honrar o legado de uma saga histórica, algo no qual “Matrix Resurrections” fracassou vergonhosamente. Além disso, conta com uma participação muito especial do mestre Mauricio de Sousa, o maior educador brasileiro, o que o transforma em um Stan Lee brazuca.
Capitão Nascimento não perdoaria. Daria vários tapas na cara apática desse Neo insosso, com jeito de John Wick gripado, gritando o seguinte: “Tira essa roupa preta! Tu é moleque! Não é o Escolhido! Pede para sair da Matrix! Pede para sair da Matrix!”.
Se o objetivo de “Matrix Resurrections” ao mostrar a cidade de Io era retratar uma comunidade marginalizada, relativamente pacificada em função de um acordo com os donos do poder, onde seus moradores sobrevivem com dificuldade e trabalho duro, “Cidade de Deus” foi muito mais competente no intento. Ademais, nenhum morador de Io possui o carisma de Buscapé, Cenoura, Cabeleira ou mesmo Dadinho… epa, “Dadinho é o c… meu nome agora é Zé Pequeno”. Neo sairia correndo diante da fúria de Dadi… Zé Pequeno.
Ninguém entendeu nada do filme do Glauber Rocha, mas ficamos com a sensação de que o problema somos nós e não a obra. Nossa intuição intelectual indica que existe algum sentido por trás do caos. Acontece o exato oposto com “Matrix Resurrections”. Ficamos lembrando do primeiro filme e pensando: era tão simples, tão direto, tão sofisticado, por que inventaram de “virar gênios”, enchendo as continuações de bobagens sem sentido e malfeitas?
No desfecho de “Matrix Resurrections” somos surpreendidos com a notícia de que Trinity também é uma “Escolhida”. Ninguém acreditou pelo simples fato de que não é uma solução com coerência narrativa com o que foi apresentado anteriormente na saga. Por outro lado, todos saímos de “Cinderela Baiana” crentes de que Carla Perez vai mesmo salvar todas as criancinhas do Brasil dançando na boquinha da garrafa e soltando passarinhos. Um final muito mais bem construído.
Se é para transformar a saga “Matrix” em uma comédia romântica de terceira categoria, que se inspirem na melhor: o casal Xuxa e Serginho Mallandro está muito mais convincente do que os Neo e Trinity ressuscitados. No final das contas eles são zumbis. Zumbis também amam? Seja como for, a banda João Penca e os Miquinhos Amestrados são vilões muito mais aterrorizantes do que o Barney e aquele agente Smith genérico.
Depois que a expressão “Red Pill” foi cancelada por ser sido adotada pelo Partido Republicano Americano, “Matrix Resurrections” não deixou por menos e “denunciou” o esquematismo simplista dos conceitos de “verdade” e “mentira”, em um mundo em que tudo precisa ser relativo. Tanto relativismo que relativiza até a Relatividade boa coisa não é. Entre essa pílula vermelha que não é mais a boa e velha pílula de 1999, fico com nosso melhor exemplar do cinema marginal: “O Bandido da Luz Vermelha”. Nesta loucura há método.
Tudo que achávamos que sabíamos sobre a Matrix, sobre Neo, sobre Trinity, sobre Morpheus, sobre o agente Smith, sobre a Oráculo, sobre o Arquiteto, sobre Zion etc, etc, etc, não vale mais. A verdade é uma verdade oculta, que parece que nem a Lily sabia. Como assim? Não sei, só sei que “Matrix Resurrections” foi assim. Melhor ficar com as histórias do Xicó. São muito mais verossímeis.
Todo mundo se lembra da história do esquerdomacho espertinho que assistiu “Bacurau” 11 vezes, com 11 namoradas diferentes. Por algum motivo, ainda por ser desvendado pela Nasa, o filme abriu o “coração” de meninas politicamente engajadas. Duvido muito que duzentas sessões de “Matrix Resurrections” renda um beijinho no rosto sequer.
Qual filme do Pelé? “Pedro Mico”? “Os Trombadinhas”? “Os Trapalhões e o Rei do Futebol”? “Fuga para Vitória”? Não importa, entre qualquer um deles e “Matrix Resurrections”, é melhor ver o filme do Pelé.