Tudo à vista

Tudo à vista

Temia prestações, crediários. Tudo que comprava pagava à vista. A bem da verdade, não comprou muita coisa na vida. Não era movido a impulsos; pensava mil vezes e, quase sempre, desistia do negócio. Estavam casados há mais de três anos e não tinham, nem mesmo, uma mesa de jantar. O apartamento, que era grande, teria que ser mobiliado aos poucos, sem prestações pelo caminho.

Tinham o básico: um fogão e uma geladeira doados pela cunhada quando renovaram a cozinha; uma boa cama; algumas cadeiras e mesinhas, espólio do antigo escritório da empresa da mulher, que havia sido fechada. A mulher, adaptada, não reclamava. Naquela altura da vida, tinha problemas maiores com que se preocupar.

No entanto, conforme a família crescia, a demanda por mais conforto aumentava. Foi então que ela resolveu desafiá-lo e dar um basta naquela situação miserável.  Comprou mesa, cadeiras, sofás, armários, uma TV enorme.

Ao chegar em casa, ele olhou as novidades desconfiado. Ela, toda orgulhosa, queria compartilhar sua alegria. Ele só queria saber de onde teria saído tanto dinheiro. Ficou deprimido ao saber das prestações a serem pagas por longos 24 meses. “Fique tranquilo, meu amor. Eu pago tudo”, disse-lhe ela com todo o carinho. Foi então que, das profundezas de sua mente, surgiu o conto de Lima Barreto que havia lido não fazia muito tempo. Naquela noite, não pregou os olhos.

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