Ao longo da história, o homem foi aperfeiçoando as condições para viver junto a seus pares. Desenvolveu técnicas de plantio, observou maneiras de aproveitar melhor o solo e a água, inventou regras para a boa convivência que, em aplicadas para todos, garantiriam a paz do grupo e legitimaria direitos. À medida em que o homo sapiens adquiria a plenitude de sua capacidade intelectual, foram surgindo facções, subgrupos que não pensavam exatamente do mesmo modo que a maioria, liderada pelo mais forte do bando. Cada um foi tendo a possibilidade de se expressar da forma que mais lhe conviesse, que julgasse mais coerente com o que seu espírito suscitava. O homem ia, a pouco e pouco, se libertando das muitas amarras que o mantinham cativo, talvez a pior delas. Ao dominar a cabeça de um indivíduo, se toma seu corpo, e esse expediente ampliado dez, cem, mil, centenas de milhões de vezes resultou num método bastante eficaz de manifestações autoritárias de poder e subjugo. Foi justamente assim que se fundamentou, por exemplo, o antissemitismo, que por sua vez serviu para o surgimento do Partido Nacional-Socialista alemão, plataforma usada para institucionalizar o nazismo, um dos regimes de governo mais perversos de que se tem notícia, responsável por exterminar cruelmente milhões de pessoas que não rezavam pela cartilha do ditador Adolf Hitler e, pior, ainda que quisessem, nunca o poderiam: sua própria natureza os impedia. O pensamento livre é uma conquista civilizatória da qual a humanidade não pode nunca abdicar, muito desistir. O pensamento livre é inerente ao ser humano e só por meio dele se pode entender o conceito da própria vida. A liberdade de opinião, de expressão, de imprensa e de religião são fundamentais numa democracia. E são as diferentes visões de mundo, pensamentos os mais discrepantes convivendo numa mesma sociedade que a tornam uma potência. A arte é tão importante para a humanidade porque além de refletir todos esses princípios, os reverbera, a fim de que o mundo nunca reste caduco e esqueça os horrores pelos quais já passou. A Bula acredita que todo mundo tem o direito de pensar e viver como gosta e, em sendo assim, separarmos dez filmes cujos roteiros abraçam temas nada convencionais, o que, por óbvio, resvala no comportamento pessoal de cada um. É o caso de “Desejarás o Noivo da Sua Irmã” (2017), do diretor Diego Kaplan, sobre parceiros infelizes no casamento, e “Branquinha” (2016), de Elizabeth Wood, que conta as desventuras de uma garota ainda meio perdida no caminho que separa o reino encantado da adolescência e a árida vida de adulto. Os títulos estão no catálogo da Netflix, e o único critério é a ordem contra-cronológica, do lançado há menos tempo para o mais antigo. Exercite a capacidade de visitar novos lugares. É lá que estão as grandes lições.
Imagens: Divulgação / Reprodução Netflix
A Netflix não agradou a todos quando decidiu bancar o thriller erótico “365 Dias”. Então o que explica o filme ser um dos mais acessados da plataforma, com centenas de curtidas e comentários nas redes? Vamos lá. Primeiro, o roteiro foi acusado de romantizar o abuso sexual, o que não deixa de ser verdadeiro. Por outro lado, a exposição de uma história que liga máfia, um casamento que nunca conseguiu deslanchar e sexo como forma de dominação só pode estar querendo dizer alguma coisa. Acrescente-se a isso o fato de parte do elenco ser do Leste Europeu e, pronto!, está armado o circo para que se queira detonar o filme sem essa nem aquela, como se apontar o problema desse azo a um novo problema. Bola no chão. Ainda que enfiando os dois pés na jaca do sensacionalismo, os diretores Barbara Białowąs e Tomasz Mandes, poloneses, sabiam muito bem onde estavam se metendo quando decidiram abordar o tema de maneira despretensiosa – despretensiosa até demais. A Europa Oriental se libertou de décadas dos governos totalitários de déspotas — a exemplo de Slobodan Milosevic (1941-2006), e Radovan Karadzic (1945), para ficarmos apenas na Sérvia — há pouquíssimo tempo. A Polônia mesmo foi palco de conflitos sangrentos em que, no desfecho, teve de se sujeitar ao domínio de uma nação mais bem preparada belicamente, a então União Soviética (hoje Rússia) no caso em tela. Por essas e outras, assuntos como os abordados em “365 Dias” são tão caros a esses povos. Mesmo com todo o primarismo técnico, o filme não se furta a acender fagulhas em meio à escuridão compulsória em que vivem certas pessoas — e certas mulheres — em algumas partes do mundo.
De que maneira uma garota de 11 anos poderia escapar da sina de viver numa família tradicional e islâmica, se abrir para o mundo e pensar pela própria cabeça, sem, no entanto, chocar ou, pior, renegar sua origem? “Mignonnes”, de Maïmouna Doucouré, traz à tela o drama de Amy que, não bastasse os muitos conflitos típicos da adolescência — as mudanças no próprio corpo, a descoberta do sexo, o desejo que vai florescendo —, tem de enfrentar sozinha questões como as que se colocam no filme. Pelas expressões vivazes da protagonista, o espectador é levado a ter ao menos uma pálida ideia do que a menina passa. Apesar de tão tenra idade, é evidente seu desespero frente a um mundo que lhe parece extremamente sedutor, vasto, cheio de possibilidades, ao mesmo tempo em que afronta tudo aquilo a que foi encorajada a crer. À medida em que trava contato com todos esses novos conceitos de vida, mais Amy se convence de que sua casa é pequena demais para ela. Apesar de todo o farelório desonesto e propositadamente confuso de críticos e gente que não viu e não gostou, “Mignonnes” consegue tocar em feridas abertas da sociedade contemporânea, como o papel da mulher num mundo em evolução constante e irreversível — e com ainda mais vigor, especula que posição a mulher muçulmana deve tomar —, bem como o desserviço que redes sociais prestam quanto a orientar e fornecer bases para a instrução dos mais jovens, em especial quando não se dispõe de uma família alerta e em consonância com o seu tempo. Crianças e adolescentes ainda têm uma personalidade bastante maleável e são esponjas, absorvendo o que o meio lhes oferece. Quanto mais Amy cresce, mais lhe domina a certeza de que viver como seus pais definitivamente não é o ideal de vida com que sonha. Resta a ela descobrir qual seria seu melhor jeito de viver. E ela tem de fazer essa importante descoberta sozinha.
Economia, política e redes sociais. O que essas três coisas têm a ver umas com as outras? Num mundo em que cada vez mais toda natureza de informação é preciosa e converge para propósitos em muitas circunstâncias escusos, as redes sociais adquirem poderes que ninguém lhe delegou e decidem o que vende, ou quem é vendável. O escândalo do emprego de dados particulares de setenta milhões de usuários do Facebook, desvendado pelos jornais “The New York Times” e “The Observer”, revelaram o procedimento nada transparente da Cambridge Analytica (CA) ao vender informações conseguidas na internet para a gigante da rede social. O argumento se funda nas evidências de que essas informações teriam sido imprescindíveis para a eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos, em 2016, e na votação do Brexit, no Reino Unido, no mesmo ano. Até aí, nada demais, não fosse por um detalhe mínimo: ninguém sequer ficou sabendo, muito menos autorizou. “Privacidade Hackeada” não consegue tocar no fundo da questão e até parece uma história ficcional ao escolher a saída fácil de culpar Mark Zuckerberg e Alexander Nix, CEOs do Facebook e da CA, respectivamente, sendo que este sofre mais com o julgamento público do que aquele. Contudo, ao longo de quase duas horas, o documentário de Karim Amer e Jehane Noujaim vale a pena por despertar a atenção do público para um assunto que, indelevelmente, vai se tornar mais e mais presente no nosso cotidiano. E não deixa de ser irônico que a própria Netflix, como todas as outras empresas, parta dos dados sobre os hábitos de consumo de seus assinantes para elaborar seu catálogo.
Antelope, Oregon, Estados Unidos, início dos anos 1980. Uma pequena comunidade de cerca de 50 aposentados partilha o rancho Big Muddy, uma sociedade em que não havia disputas ou maiores preocupações. Pano rápido e tudo muda quando acólitos do guru indiano Rajneesh, mais conhecido como Osho, resolvem se instalar na localidade. Eles fundam uma cidade e, a partir de então, se sucede uma escalada de conflitos e ódio de parte a parte. A despeito das desavenças, a seita se expande, até que tudo rui. Em “Wild Wild Country”, série produzida pela Netflix e dirigida pelos irmãos Maclain e Chapman Way, o público conhece a fundo o cotidiano dos seguidores de Osho por meio de depoimentos inéditos que se destacam por darem voz aos mais controversos lados da questão e ouvem quase todos os que presenciaram os acontecimentos narrados. Falam rancheiros, os próprios adeptos da agremiação, agentes do FBI e a líder do grupo, Ma Anand Sheela, e os diretores se valem ainda de vídeos que registram as opiniões de ambos os lados e imagens de programas de televisão e jornais que se dedicaram à cobertura do caso. É graças a elas que se vislumbra, finalmente, a fisionomia do guia espiritual, que morreu em 1990. O filme levanta uma discussão interessante acerca da liberdade de expressão e de religião, ao mencionar os sannyasins — termo pelo qual ficaram conhecidos os simpatizantes de Osho — como pessoas supostamente pacíficas, defensoras de valores louváveis, a exemplo de economia autossuficiente, comunidade com um modelo de gestão inovador, a educação distribuída como o bem maior, entre todos, além de práticas menos unânimes, a exemplo do amor livre. Mesmo assim, Antelope não foi muito com a cara de seus novos habitantes, tentaram de tudo para tirá-los de lá, mas foi inútil. O que resta ao final de oito horas divididas em seis episódios é a reflexão sobre o que a comunidade de fanáticos representou na história daquele povoadozinho perdido no Oregon. É impossível entender o motivo que leva alguém a dedicar a vida a seguir um homem que prega a elevação da alma enquanto tem noventa Rolls Royce, por exemplo. Coisas do pragmatismo ianque.
Problemas de relacionamento são a tônica em qualquer família. É simplesmente inviável se dar com todos, por mais fortes que sejam os laços de sangue. Tanto pior se as diferenças são tão gritantes. É esse o plot de “Desejarás o Noivo da Sua Irmã”, produção argentina dirigida por Diego Kaplan. Na primeira cena do filme, se tem uma boa ideia do que virá a seguir. Duas meninas, as irmãs a que alude o título, brincam enquanto assistem a uma fita de faroeste na tevê. Ao montar numa almofada, à guisa de cavalo, uma delas, Ofelia, atritando o corpo contra o acessório, tem um orgasmo. A ousadia do diretor teve um preço: Kaplan — e a própria Netflix — tiveram problemas com a justiça após acusações de maus tratos e abuso contra menores. Escaparam graças à sua antevidência – ele gravara o making of da sequência, temendo possíveis ações judiciais, a fim de deixar claro em que circunstâncias tudo ocorreu. O filme segue, mostrando a adolescência das duas ao longo dos anos 1970, o envolvimento com uma dupla de irmãos, o rompimento trágico. Lucia, a outra irmã, torna-se uma cantora famosa, e se casa com Juan. A festa, na casa dela, corre sem sobressaltos, até que Ofelia resolve aparecer, com Andrés, o namorado brasileiro a tiracolo. No primeiro approach entre ela e o noivo da irmã, já se nota a tensão sexual que paira sobre os dois e vai pesando cada vez mais. Ele a flagra de toalha no quarto em que dorme com Lucía e seu interesse pela cunhada até então desconhecida sai do controle quando descobre cassetes em que Ofelia fazia uma espécie de autoanálise, toda pontuada por suas impressões sobre o sexo.
A busca pelo desempenho perfeito num torneio que reúne competidores de todo o mundo decerto é o objetivo que todo atleta persegue — às vezes ao longo de toda uma vida. Nem se sempre se conseguem bons resultados “de cara”, “limpo”, sem o auxílio de substâncias que alterem e potencializem o metabolismo, a fim de tornar o pódio um lugar menos inalcançável. Bryan Fogel parte da premissa de que testes antidoping são, quase sempre, dispensáveis e, pior, ineficazes, e quis sacramentar sua tese por meio da prática. Em 2014, fora o 14° na Haute Route, nos Alpes franceses, “o evento de ciclismo amador mais difícil do mundo”, segundo ele. A corrida realmente é puxada. São sete dias de competição numa pista em aclive. No ano seguinte, ele voltou aos Alpes a fim de tentar um resultado menos vexatório, desta feita se sujeitando à administração de suplementos proibidos, tudo acompanhado pelo doutor Rodchenkov, um médico russo, durante cinco meses. Queria demonstrar que não seria pego, e se assim fosse, qualquer desportista, amador ou não, poderia fazer o mesmo e ser analisado pelo antidoping sem risco. Acontece que Fogel, apesar de 20% mais forte, caiu para o 27° lugar. Descontando-se o câmbio da bicicleta ter sofrido uma avaria na quarta etapa, ele poderia ter apresentado uma performance ao menos equivalente à anterior. No discurso de agradecimento no Oscar, Fogel, em nome da verdade, elogiou Rodchenkov, sem atentar para a evidência de que o médico passou a ser detratado e perseguido pelo governo autoritário de Vladímir Putin. O que Fogel conseguiu com “Ícaro” — o personagem da mitologia grega que queria voar, mas subiu tão alto que o sol derreteu a cera de suas asas postiças —, foi provar que o doping não só não compensa como atrapalha. E se deve questionar, também, a honestidade de seus métodos.
A pobreza, em suas variadas e cruéis gradações, é implacável com todos. Tanto pior quando se é moradora do subúrbio de uma metrópole, e em se tratando dos Estados Unidos, um país que sobrevaloriza o sucesso — financeiro, que se diga —, as coisas se exacerbam o seu tanto. As crises existenciais tão próprias do início da vida adulta se tornam ainda mais pungentes num cenário como esse, e as chances de se perder são consideráveis. Em “Branquinha”, Leah, que como explicita o título do filme, é caucasiana, vai morar em Nova Iorque a fim de estudar. Com o dinheiro de que dispõe, tudo o que consegue é alugar, com uma amiga, um pequeno apartamento no Bronx. Embora a vizinhança não seja exatamente arisca — e os problemas vão começar aí —, a violência do tráfico impera. Ao sair para comprar um baseado de maconha enquanto recebia amigos para mostrar a casa nova, a garota conhece Blue, um traficante que passa ao largo do interesse da polícia, tamanha sua irrelevância no submundo do crime. À medida que se aproximam, Leah é levada a também comerciar drogas. Eles passam a namorar, mas ela não se desvencilha das investidas do chefe — e cede, mais de uma vez. O enredo dá a entender que Leah é uma pobre menina ingênua, que faz o que faz sempre coagida por um personagem masculino. É um modo de ver a vida, reducionista, entretanto. É mais adequado apreender-se a história do ponto de vista do poder que todos temos, ricos ou não, de fazer escolhas. Sob esse ponto de vista, “Branquinha” é uma flor no lodo.
“Um Amor Verdadeiro.” Este também poderia ser o nome do filme de Tom Hooper que conta a peculiar história do casal de pintores dinamarqueses Einar e Gerda Wegener. Ele, um artista cujo talento já era ampla e merecidamente reconhecido, faz de tudo para incentivar Gerda, que ainda tropeça na carreira. A fim de ganhar tempo e economizar uma ninharia qualquer que pode fazer falta, sugere a Einar que pose para ela, o que não constituiria problema algum, excetuando-se o fato de que Gerda retrata um tipo feminino. Ele, a princípio constrangido, acata a ideia, e logo começa a questionar sua vida até ali. A experiência se repete e Einar chega à conclusão de que estaria sendo impiedosamente perverso consigo mesmo se não encarasse a realidade que sua própria alma lhe revelava: ele é na verdade o que a ciência hoje denomina como uma mulher transexual, um homem que não se adequa à sua condição biológica, trocando em miúdos. Apesar de devastada por saber que, cedo ou tarde, vai perder o grande amor de sua vida, Gerda retribui todo o apoio que Einar sempre lhe devotara e aceita que o marido assuma publicamente a nova identidade. Quando ele, enfim, decide se submeter a uma polêmica — e arriscada — cirurgia de redesignação de gênero no hospital em que clínica o doutor Warnekros, na Alemanha, Gerda o acompanha. Na primeira etapa da intervenção tudo corre bem, mas o fim de Lili — o nome que Einar adota na vida que passa a ter —, é infausto. “A Garota Dinamarquesa” é o típico caso de filme de ator, em contraposição à pletora de filmes de autor que o cinema produz ano após ano. Eddie Redmayne talvez seja o maior representante da arte dramática de sua geração. Em todos os trabalhos a que se dedica, Redmayne deixa a marca de um artista que leva o personagem para a cama sem qualquer prurido de melindrar os brechtianos de plantão (profissional até o osso, como não mencionar a sua interpretação mediúnica do físico britânico Stephen Hawking em “A Teoria de Tudo”?). “A Garota Dinamarquesa” é lindo, emocionante, alentador, vibrante. Mérito quase integral de Eddie Redmayne.
Um clássico é sempre um clássico, e os clássicos nunca morrem. “Instinto Selvagem” caminha para sua terceira década deixando no chinelo muitas produções do mundo 5.0. O enredo, envolvente, narra a saga do policial Nick Curran, em maus lençóis por ter de desvendar um crime supostamente cometido pela monumental Catherine Trammel, a escritora de, claro!, thrillers que faz de tudo para afastar os tiras de seu belo cangote loiro. Catherine é uma genuína vamp, uma devoradora de homens (e não só), que além de linda, é rica de pai e mãe e muito bem-sucedida na carreira literária. Talvez por isso encare a vida como mero passatempo, seduzindo todo mundo e largando um rastro de corações estraçalhados pelo caminho. A cena da cruzada de pernas mais controversa — e vista — da história do cinema já daria um filme. Aquele framezinho de nada gerou mal-estar nos bastidores, e acusações de assédio moral por parte da atriz principal do longa ao diretor Paul Verhoeven. Polêmicas à parte, queira Sharon Stone ou não, “Instinto Selvagem”, esse curto registro da trama e a própria atriz tornaram-se cult. Sorte nossa.
Os enfant terrible do cinema atacam de iconoclastas nesta hilariante comédia britânica dirigida por Terry Jones, um dos membros do Monty Python, grupo de humoristas ingleses formado ainda por Graham Chapman, John Cleese, Terry Gilliam, Eric Idle e Michael Palin. E o segundo longa da trupe deu mesmo o que falar: a trama, um sacrilégio para a Igreja, chegou a ser censurada e proibida em alguns países. Na história, uma paródia livremente inspirada no que dizem as Escrituras acerca do Filho do Homem, o protagonista chama-se Brian Cohen, judeu como Cristo e como Ele também nascido numa manjedoura. Os três homens espertos, uma menção aos reis-magos, o confundem com Jesus e lhe ofertam ouro, incenso e mirra. Todavia, ao perceberem o mal-entendido, voltam e reavem os presentes, a fim de os destinarem ao verdadeiro Messias. Passados 33 anos, Brian continua tão pobre e desvalido como ao nascer, até que se envolve com a Frente Popular da Judeia e ganha a confiança do líder da agremiação, Reg, que o persuade a sequestrar a mulher do imperador romano Pôncio Pilatos. Ele não tem sucesso na empreitada, mas seu pretenso destemor logo é conhecido em toda parte e ele é aclamado como o salvador do povo judeu. A súbita fama de Brian lhe acarreta a fúria do Império, que o encarcera e, posteriormente, condena à agonia da execução no madeiro, do qual nenhum admirador o remove. Muito mais que mera peça para a promoção de ideologias marxistas e anticristãs, como se aventou à época de seu lançamento, “A Vida de Brian” é uma crítica peremptória e acertada contra a religião organizada, hipócrita e repleta de fanáticos ignorantes, cínicos e, como se não bastasse, corruptos, além de, por óbvio, tirar um belo sarro das produções épicas de Hollywood, que enxergam Jesus como um super-herói, acima do bem e do mal e à prova de qualquer drama de consciência.