Essa pandemia tá osso. Estava me sentindo tão entristecido nos últimos dias. Um misto de melancolia, impotência, incertezas e desesperança. Nuanças de depressão, talvez, explicassem os meus sentimentos. Pensei: “Cara, isso não está certo. Não posso me deixar abater. Preciso dar um jeito nessa banzeira”. Cigarros? Não fumava. Vinho? Bebia, socialmente, nunca ao ponto de me embriagar. Sexo? Não sentia tesão quando estava down. Medicamentos? Que se fodesse a indústria farmacêutica, eu não tinha mais 27 anos. A droga da internet? Talvez, na falta de coisa melhor para me alienar.
Era mais do que hora de recorrer à música, à boa música, frise-se. Tocar um sertanejo universitário, por exemplo, não me levaria a nenhum platô alvissareiro. Provavelmente, continuaria macambúzio, só que raivoso também. Se eu tenho preconceito musical? Óbvio que sim. Ninguém é perfeito. Além de escrever coisas desagradáveis, abomino música ruim, principalmente, as comerciais, produzidas só para fazer dinheiro e para catapultar cretinos simpáticos e carismáticos ao estrelato.
Escutar os Beatles, por exemplo, no meu caso, não tinha erro, era golpe líquido e certo na garganta da tristeza. Uma das vantagens de curtir o velho repertório dos Fab Four era que você não precisava pular de música. Punha pra tocar e pronto. Gosto de Beatles deste a época em que eu tinha cabelo e se ouvia música pelo rádio e pelos discos. Letras impressas no encarte. Cheiro de gráfica. Um luxo só. Estou ficando velho, vocês têm razão. E seletivo também. Não ouço músicas com qualquer pessoa. Não perco mais tempo com as tranqueiras e faço questão de manter distância de gente tóxica.
Eu me senti tão aliviado logo após de ter ouvido “Abbey Road”, o último disco que os caras gravaram, que concluí: “Preciso dar uma força moral aos parceiros, ajudar os meus irmãozinhos que, eventualmente, se sintam tão mal quanto eu me sinto de vez em quando”. Não está fácil pra ninguém. Só para os canalhas. Eles são muitos, mas, não são a maioria. Vamos iluminar essas trevas por que passamos, em breve. Não perco a fé na ciência e na democracia. A roda gigante da história vai girar mais rápido do que se imagina.
Portanto, verdadeiramente imbuído de espírito altruísta, compilei uma lista com 40 canções de altíssimo nível, ao meu gosto, obviamente, sendo 20 brasileiras e 20 internacionais. Há muito mais preciosidades de onde essas saíram. Exercitei o meu poder de concisão e cheguei a 40 pérolas musicais, a maior parte delas, dançantes, feitas pro ser humano esquecer que é certinho e requebrar. Sugiro que sejam ouvidas em altíssimo volume. Avisem aos vizinhos, ao síndico do prédio, que vocês vão exceder um pouquinho o limite permitido de decibéis de acordo com o estatuto do condomínio. Expliquem que a causa será justa e que eles tenham um pouco de paciência, de compaixão, por aqueles que, como a maioria, se sentem mais por baixo do que diferencial de sapo. Eles vão compreender e, quem sabe, até sorrir com o chiste. São coisas que podem suceder a qualquer um.
Feito esse indispensável preâmbulo, recomendo que afastem a mobília da sala, aumentem o som até o talo e deixem a música funcionar, fazer o resto, embalar vocês. Se não se sentirem mais leves com o setlist que eu indiquei, meus parceiros de nostalgia, eu lhes pagarei um drinque. Quem sabe, um vinho, até que o bom da vida nos embriague a todos. Na medida do possível, buscando relevar minimamente os dramas pessoais, que não são poucos, façamos como cantou Bob Marley: “Não se preocupe com nada, porque cada pequena coisa vai ficar bem”. É isso aí.
Playlist
Trilha brasileira
1 — Canta, canta, minha gente (Martinho da Vila)
2 — Andar com fé (Gilberto Gil)
3 — Dancing Days (Lulu Santos)
4 — Vou deixar (Skank)
5 — Anjos pra quem tem fé (O Rappa)
6 — Pro dia nascer feliz (Barão Vermelho)
7 — Saideira (Skank e Santana)
8 — Não quero dinheiro, só quero amar (Tim Maia)
9 — Tente outra vez (Raul Seixas)
10 — O que é, o que é (Gonzaguinha)
11 — Brasil pandeiro (Novos Baianos)
12 — Quando o sol bater na janela do seu quarto (Legião Urbana)
13 — Enquanto houver sol (Titãs)
14 — É preciso saber viver (Titãs)
15 — É hoje (Caetano Veloso)
16 — Apesar de você (Chico Buarque)
17 — Amanhã (Guilherme Arantes)
18 — Mais uma vez (Renato Russo)
19 — Aquarela do Brasil (Gal Costa)
20 — Deixa a vida me levar (Zeca Pagodinho)
Trilha internacional
1 — Jump (Van Halen)
2 — Celebration (Kool & The Gang)
3 — What a wonderful world (Louis Armstrong)
4 — Three little birds (Bob Marley)
5 — Happy (Pharrel Willians)
6 — I will survive (Gloria Gaynor)
7 — Don’t stop believin’ (Journey)
8 — Raindrops keep falling on my head (B. J. Thomas)
9 — Eye of the tiger (Survivor)
10 — We are the champions (Queen)
11 — Imagine (John Lennon)
12 — Let it be (The Beatles)
13 — Heal the world (Michael Jackson)
14 — I got you, I feel good (James Brown)
15 — I can see clearly now (Jimmy Cliff)
16 — Give a little bit (Supertramp)
17 — All you need is love (The Beatles)
18 — Good times (Chic)
19 — Don’t worry, be happy (Bobby McFerrin)
20 — I want to break free (Queen)