A Bula reuniu em uma lista os 15 livros mais impactantes da história da literatura, obras que trazem reflexões atemporais sobre a humanidade, e são capazes de transformar vidas. A seleção foi baseada em uma votação que foi realizada com os seguidores da Revista Bula no Twitter. Estão presentes livros de diferentes épocas e nacionalidades, desde clássicos do século 19, como o romance russo “Anna Kariênina” (1877), de Liev Tolstói; até obras lançadas recentemente, como “A Mulher Ruiva” (2018), do autor turco Orhan Pamuk. Os títulos estão organizados de acordo com o ano de lançamento: dos mais novos para os mais antigos.
Perto de uma pequena cidade turca, um escavador de poços e um aprendiz são contratados para procurar água num terreno baldio. À medida que cavam o poço, sob um calor abrasador, vai-se desenvolvendo uma forte ligação entre ambos, como se fossem pai e filho. Os dois trocam histórias que refletem diferentes visões do mundo. Contudo, o desejo e o medo do desconhecido fazem com que o protagonista tome uma atitude completamente inesperada que mudará para sempre o rumo de sua vida. Com rara habilidade narrativa, Orhan Pamuk constrói mais um romance memorável sobre as relações humanas e o poder que pequenas decisões exercem em nossa trajetória.
Em Kolimá, região desolada no extremo leste da Sibéria, onde as temperaturas alcançam 60 graus negativos, localizavam-se alguns dos campos de trabalhos forçados mais terríveis da era stalinista. Foi nessa região que o escritor russo Varlam Chalámov cumpriu a maior parte de sua pena de quase 20 anos, trabalhando até 16 horas por dia em minas de ouro e carvão, constantemente doente e subnutrido. Ao final desse período, retornou a Moscou e, no ano seguinte, começou a escrever sua obra-prima: as mais de 2 mil páginas dos Contos de Kolimá — divididas em seis volumes — trabalho que lhe tomou outros 20 anos e no qual a escavação profunda da memória é acompanhada a cada passo por uma reflexão aguda sobre os limites do humano em face de experiência tão brutal.
Num futuro não muito distante, o planeta encontra-se totalmente devastado. As cidades foram transformadas em ruínas e pó, os céus ficaram turvos com a fuligem e os mares se tornaram estéreis. Os poucos sobreviventes vagam em bandos. Entre eles, um homem e seu filho, que não possuem praticamente nada, buscam a salvação e tentam fugir do frio, sem saber, no entanto, o que encontrarão no final da viagem. Essa jornada é a única coisa que pode mantê-los unidos e lhes dar esperança para continuar vivendo. Com “A Estrada”, Cormac McCarthy ganhou o Prêmio Pulitzer de Ficção 2007.
Com base nos acontecimentos históricos ocorridos na fronteira entre os EUA e o México no século 19, Cormac McCarthy reinventa a mitologia do Oeste americano. A história acompanha um garoto sem nome, conhecido apenas como “kid”, que é forçado a deixar o lar ainda na infância. Para sobreviver, ele ingressa na gangue brutal do capitão John Glanton, uma companhia de mercenários que, a mando dos governantes locais, atravessa o deserto com a missão de matar o maior número possível de índios e trazer de volta seus escalpos. Glanton é acompanhado pelo juiz Holden, um personagem macabro que nunca dorme e anota em um caderno todas as suas observações cruéis.
Em um texto que entrelaça o novelesco, o lírico e elementos bíblicos, “Lavoura Arcaica” narra a vida de André, um jovem do meio rural que decide abandonar a numerosa família do interior para morar sozinho em outra cidade. Fugindo do ambiente sufocante da lavoura, ele procura se afastar da rigidez moral de seu pai e da paixão incestuosa pela própria irmã, Ana. Os parentes estranham o desaparecimento de André, e o irmão mais velho, Pedro, é encarregado de trazê-lo de volta. É a partir das indagações de Pedro que surgem as lembranças de André. Logo após a publicação, o livro mostrou-se revolucionário, conquistando o status de clássico da literatura brasileira.
Uma das obras-primas de Gabriel García Márquez, o livro narra a fantástica e triste história da família Buendía, que vive na pequena e fictícia Macondo, ao longo de um período de cem anos. A trama acompanha as diversas gerações da família, assim como a ascensão e a queda do vilarejo em que vivem. Os Buendía nascem e morrem, vão embora ou permanecem na aldeia até seus últimos dias. O que todos possuem em comum é a luta contra a realidade e a solidão que sentem, mesmo vivendo em meio a muitos. O livro é considerado a obra que consagrou Gabriel García Márquez como um dos maiores autores do século 20.
Uma cirurgia revolucionária promete aumentar o QI do paciente. A técnica foi testada em vários animais e o grande sucesso foi com Algernon, um rato de laboratório. Charlie Gordon, um homem com deficiência intelectual severa, é selecionado para ser o primeiro humano a passar pelo procedimento. O experimento é um avanço científico sem precedentes, e a inteligência de Charlie aumenta tanto que ultrapassa a dos médicos que o planejaram. Charlie passa a ter novas percepções da realidade e começa a refletir sobre suas relações sociais e até o papel de sua existência. À medida que sua inteligência atinge o pico, a de Algernon declina repentinamente e ele morre. Então, Charlie percebe que seu aumento de QI também é temporário e começa a pesquisar para encontrar a falha no experimento.
Tendo como cenário as ruas miseráveis de uma Nápoles em ruínas, após a expulsão dos alemães nazistas pelo Exército Americano, o livro acompanha as observações do Capitão Malaparte, responsável por fazer a ligação entre os italianos antifascistas e o exército aliado. O ano é 1943, a cidade está um caos, a prostituição é desenfreada e o cheiro de morte se espalha por todos os lugares. Para sobreviver, as pessoas são capazes de tudo, inclusive vender os próprios filhos. Todo o desastre é supervisionado por soldados americanos que, na sua ingenuidade, não sabem exatamente o que estão fazendo ali. Misturando realidade e ficção, o autor registra os grandes horrores deixados pela Segunda Guerra Mundial.
Em “É Isto um Homem?”, o escritor e químico italiano Primo Levi relembra seu sofrimento num campo de extermínio, mas sem invocar qualquer resquício de autopiedade ou vingança. Deportado para Auschwitz em 1944 entre outros 650 judeus italianos, Levi presenciou o quanto os opressores podem ser cruéis e indiferentes à vida alheia. Com apenas 24 anos, Levi teve que criar mecanismos para sobreviver: saber em quem devia ou não confiar, adaptar-se à rotina cruel de trabalho no campo de concentração e, principalmente, não formar laços de afeto, pois era cruel viver o luto por um amigo em um ambiente tão hostil. Levi foi um dos poucos que sobreviveram à Auschwitz, retornando para a Itália em 1945, após a chegada dos russos à Polônia.
Obra-prima de Dino Buzzati, “O Deserto dos Tártaros” marcou a consagração do autor entre os grandes nomes da literatura italiana e foi eleito pela crítica especializada um dos melhores livros do século 20. A obra narra a história do jovem tenente Giovanni Drogo, que recebe com alegria uma missão no forte Bastiani ― para ele, a primeira etapa de uma carreira gloriosa. Embora não pretendesse ficar por muito tempo, o oficial de repente se dá conta de que os anos se passaram enquanto, quase sem perceber, ele e seus companheiros alimentavam a expectativa de uma invasão estrangeira que nunca aconteceu. A espera pelo inimigo transforma-se na espera por uma razão de viver e na renúncia da juventude.
O livro conta a história de um jovem engenheiro naval alemão, chamado Hans Castorp. Ele visita o primo numa clínica destinada ao tratamento de tuberculosos em Davos, na Suíça. Apesar de ir ao local apenas para uma visita, Castorp começa a apresentar sintomas de tuberculose e acaba estendendo sua estadia por anos, sempre adiando sua saída por causa da doença. Nesse período, o jovem se afasta de sua carreira e família, sendo atraído pela doença e pela introspecção. Thomas Mann começou a escrever “A Montanha Mágica” em 1912, mesmo ano em que sua mulher, Katharina, foi internada com tuberculose. O livro teria sido inspirado nesse episódio.
Nesta novela, Tolstói narra a história de Ivan Ilitch, um juiz de instrução que, após alcançar uma vida confortável, descobre que tem uma grave doença. A partir daí, ele passa a refletir sobre o sentido de sua existência e percebe que poucos momentos que viveu realmente tiveram significado e que seu desempenho durante a vida foi superficial, tanto no trabalho quanto nas relações sociais. Preso ao leito, diante da morte iminente, o juiz tem a oportunidade de meditar, algo que as preocupações corriqueiras o impediram de fazer antes. Ivan Ilitch quer morrer para dar um fim à dor, mas seu instinto de sobrevivência insiste em fazê-lo lutar pela vida.
Chamada por Freud de “a maior obra da história”, “Os Irmãos Karamazov” foi o último romance de Dostoiévski, terminado pouco antes de sua morte. Um livro ao mesmo tempo filosófico e policial, que trata da conturbada relação entre o devasso Fiódor Karamázov e seus três filhos: Aliócha, puro e místico; Ivan, intelectual e atormentado; e Dmitri, orgulhoso e apaixonado. Com uma trama hipnotizante, Dostoiévski conduz o leitor numa viagem única pelos recantos mais sombrios e luminosos da alma humana. Um marco da literatura universal, influenciou pensadores como Nietzsche — e sucessivas gerações de escritores em todo o mundo.
Publicado originalmente em forma de fascículos, entre 1875 e 1877, a obra conta a história de Anna Kariênina, uma aristocrata da Rússia Czarista que aparentemente tem uma vida perfeita, com riqueza, um casamento estável, popularidade e um filho amado. Mas, em seu interior, ela se sente extremamente vazia. Isso muda quando ela conhece o impetuoso oficial Conde Vronsky, com quem inicia um caso extraconjugal. Vronsky afirma que se casará com ela assim que ela se divorciar do marido, Alexey Karenin, mas Anna é vulnerável às pressões da sociedade. Ao mesmo tempo, ela teme que Vronsky se relacione com outra mulher e se torna cada vez mais possessiva e paranoica.
O livro retrata a vida de Rodión Románovitch Raskólnikov, um estudante de direito que vive em um cubículo em São Petersburgo. O jovem ganha dinheiro fazendo pequenas traduções, mas vive à beira da miséria e não consegue honrar seus compromissos básicos, como o aluguel. Desesperado por dinheiro, ele planeja matar velha Aliena Ivánovna, uma agiota. Ele tenta justificar seu ato por meio de uma teoria: se grandes homens, como César ou Napoleão, foram assassinos absolvidos pela História, por que ele não seria? Quando a polícia resolve investigar o crime, Raskólnikov se sente perturbado ao ser interrogado pelo juiz Porfiri Pietróvitch.
Bônus
Bibiana e Belonísia são filhas de trabalhadores de uma fazenda no Sertão da Bahia, descendentes de escravos para quem a abolição nunca aconteceu realmente. Intrigadas com uma faca dentro de uma mala misteriosa sob a cama da avó, atrevem-se a pegá-la e um acidente muda para sempre suas vidas, tornando-as ainda mais próximas. Porém, com o avançar dos anos, a proximidade vai se desfazendo: enquanto Belonísia parece satisfeita com o trabalho na fazenda e os encantos do pai, Zeca Chapéu Grande, Bibiana percebe desde cedo a injustiça da servidão que há três décadas é imposta à família e decide lutar pelo direito à terra e emancipação dos trabalhadores. Para isso, é obrigada a partir da fazenda, separando-se da irmã.
Italo Calvino mostra a jornada de um Leitor e de uma Leitora que tentam de diferentes maneiras terminar a leitura de “Se Um Viajante Numa Noite de Inverno”. Após pegar a obra recém-lançada, o personagem percebe que ela está defeituosa e o primeiro capítulo se repete. Ele retorna à loja, onde encontra a Leitora, que passa pelo mesmo problema. Eles descobrem juntos que o capítulo não se refere à obra que buscavam, mas a uma história polonesa, que acaba distraindo-os. Eles trocam o exemplar de “Se Um Viajante Numa Noite de Inverno”, mas a leitura logo é interrompida novamente por várias páginas em branco. Assim por diante, Italo Calvino escreve dez inícios para um mesmo romance, criando uma alegoria para a literatura no mundo capitalista, no qual o leitor está condenado à leitura de obras superficiais que servem ao entretenimento.