Se não for verdadeiro, não dura

Se não for verdadeiro, não dura

Soube que você anda por aí perguntando por mim… Me disseram que te planto questões e que meu jeito de falar de amor e clamar amor te parece um tanto exagerado. Não é exagero, não. Minhas hipérboles sentimentaloides podem até parecer dramáticas, vá lá, mas são verdadeiras. E verdade é uma coisa que levo comigo por onde eu vou. Sempre tenho na mala.

Costumo seguir meu coração e vou te contar que, até hoje, ele nunca me deixou na mão. Não faço nada que me faça mal, não prostituo meus sentimentos nem as minhas vontades. Sou honesta comigo, fiel a mim e às minhas crenças. Acho que a verdade é uma das sete maravilhas do mundo sentimental. Mesmo quando ela é dolorida ou apática, é bonita ao despir-se sem filtro e sem fuga.

Eu vou te contar uma coisa: coração é bicho esperto. Uma mistura de raposa velha, com macaco prego e onça pintada. É astuto, fareja o perigo de longe. E por mais que, muitas vezes, ele tenha cara de urso panda, isso não significa que lá no fundo não habite o grande rei da selva. É o coração que manda e desmanda em tudo, e ele, somente ele, que diz a verdade sobre nós mesmos e sobre os outros. Às vezes o coração grita, cochicha, mas sempre dá com a língua nos dentes.

A realidade é que somos todos bichos, animais selvagens vivendo e sobrevivendo de instintos e senso comum. Esfomeados por carne, farejando suor, caçando presas e companhia, buscando aconchego em um lugar quente e seguro. Numa manada de leões, a briga pela liderança é feia e sangrenta. Acontece que, no meio de tantos reis, ninguém quer o posto de vice. Só que até para reinar é preciso verdade. Verdade, honestidade, cara limpa, coração aberto e força, sim, para não atolar junto dos corações alheios feitos de lodo.

Cara bonita e voz mansa conquistam qualquer um. Eu, você, todo mundo. Mas se não for verdadeiro, de dentro para fora, nada, absolutamente nada perdura. Com o tempo, o gato persa dá lugar ao leão que sempre esteve ali, andando manso por detrás das plantas. Toda mentira tem prazo de validade. Pode apostar. Seja ela qual for. Bondade obrigatória perece porque não é sincera. Trabalho forçado desmorona com a primeira crítica. Caridade da boca pra fora nem sai de casa. Prova de amor escrita não dá conta em exame oral.

Ninguém consegue se camuflar por muito tempo. Não há sorriso nem olhos azuis ou paparicos que consigam dar rasteira em coração felino. Mais dia, menos dia, o bicho pega, mostra os dentes e cai na própria armadilha. O que não é real, felizmente, escorre e se dissolve bem na nossa cara.

Cada um é o que é. Ponto final. Lobo é lobo e cordeiro é cordeiro. Claro que o grande barato disso que chamamos de vida, selva ou seja lá o que for, é crescer e aprender, evoluir e chegar lá adiante melhor do que começamos. Só que nesse caminho é fundamental se desprender da malandragem de passar a perna em nós mesmos. Honestidade, sempre, de dentro para fora, para identificar nossos monstros e saber lidar com eles. A partir do que somos e temos para dar, sejamos verdadeiros com quem bate à nossa porta.

Karen Curi

é jornalista.