Preciso de férias. Férias de gente

Preciso de férias. Férias de gente

Férias de gente mesquinha. Férias dos invejosos. Férias de estressados no trânsito. Férias dos falsos amigos. Férias das sanguessugas. Férias dos vizinhos encrenqueiros. Férias dos mal educados e dos mal agradecidos. Férias dos moralistas. Férias dos preconceituosos. Férias dos egoístas, dos estraga prazeres, dos sem noção.

Ah, como eu esperei por você, férias! Trabalhei o ano inteirinho, acordei cedo, aguentei muita gente chata, mentira descarada, topada no dedinho, crise renal. Conheci pessoas novas e também algumas antigas, porque nunca é tarde para conhecer, de fato, alguém. Tive surpresas boas e outras ruins, vontade de socar e me atracar com uns e outros. Senti raiva, angústia, ciúme, medo, rancor. Me entupi de gente para fugir da solidão e depois corri para me deitar com ela na cama. Quis dormir um mês inteiro para esquecer uma dor. Pensei em largar tudo, pegar uma mochila e sair pela estrada afora, pedir carona, tentar a sorte por aí.

Foi um ano difícil, férias, mas se eu pudesse tiraria mesmo uma folga de algumas pessoas, porque o trabalho não me amedronta. Férias eternas de gente pesada, me entende? Mas como sei que isso é difícil eu vou levando, fingindo não ver, nem dar ouvidos, nem a mínima importância para essas coisas. Acontece que, quanto mais perto do fim do ano, mais a paciência vai saturando, o saco vai enchendo, rasgando, pingando a sujeira guardada ao longo dos meses.

O barulho das buzinas me atormenta até em sonho, e o trânsito, cada vez mais caótico, tem me feito ranger os dentes e respirar profundo umas cem vezes ao dia. Estou cansada dos trogloditas e sem educação que passam na frente, que furam a fila, que pisam no pé. Gente que não pede licença e nem desculpa. Que não tem tempo para escutar o outro, que olha e não consegue enxergar o que está lá, bem diante do nariz. Preciso de férias dos abraços frouxos, das mãos soltas e beijos secos… Estou exausta da falta de tempo para amar e das prioridades às avessas.

Contudo, tenho que admitir que este ano também teve lá suas coisas boas. Muito boas, por sinal! Porque apesar da dor de dente, algumas cólicas e resfriados, minha saúde não me tirou o sono. Tive trabalho, muito trabalho, graças a Deus! Aprendi com os sambas da vida que é preciso dividir para somar, e que o arco-íris só chega depois da tempestade. Outra coisa; honestidade, gratidão e aprendizado nunca é demais.

Mas todo ano é assim mesmo. Começa cheio de esperança e perspectiva, que com o passar dos dias vão se desprendendo de nós, ficando para trás nas esquinas e bares, copos e sofás. Então, exauridos de força e sonhos, entupidos de tanta falta de amor e educação, chega o momento em que todos precisam de férias. Férias até dos nossos próprios bueiros e ratoeiras. Só assim para recomeçar, outra vez, limpos para o próximo ciclo.

Meu desejo, neste ano novo, é conseguir tirar férias dos problemas, dos chatos, dos desamores e dos pessimistas. Quero uma rosa branca para cada sorriso, um barco cheio de fé, um céu estrelado, pular de mãos dadas sete ondas com sete amigos e acordar com o pé direito e um amor no peito!

Adeus ano velho, feliz ano novo!

Karen Curi

é jornalista.