Fim de ano. Chegou aquela hora de mexer nos armários, desencaixotar saudades, separar o que te cabe e o que já não cabe mais. Aquilo que em uma época te fez bem, feliz, ainda mais bonita, mas hoje te aperta, entristece, pesa mais de uma tonelada. Olha, não se aflija por isso não, pelo que um dia foi luz e acabou se transformando em sombra. Acontece com você, comigo, com todo mundo. É que tudo nessa vida tem um prazo de validade, e não poderia ser diferente com o amor.
Mas, amor, como eu costumo dizer, tem de todo tipo e pra todo lado. Às vezes, o que pra gente é verdadeiro, pro outro é só um passatempo, paixão, amizade colorida ou seja lá o que for. Então… O amor expira. Tem vezes que ele passa por um longo e rigoroso inverno, depois se renova, reinventa, renasce de mansinho e, quando menos se espera, floresce outra vez. Pode ser que as flores já não venham lindas como antes, mas surgem indiscutivelmente fortes e resistentes.
Outras vezes, não. O amor morre mesmo e o defunto fica ali, fedendo no armário, enquanto a gente tapa o nariz, empurra a porta, finge não estar vendo. Mas ele está lá, apodrecendo dentro de caixas e envelopes, roupas com perfume velho, papéis amarelados e apagados, deteriorando dentro e fora de nós. Há quem diga que AMOR, em caixa alta, nunca morre… O que eu sei é que as lembranças, essas sim, duram para sempre.
Memórias são como estrelas, infinitas, que se deixam ver quando chega a noite, piscando no céu da vida. Não importa quanto tempo passe: nem as manchas e as rugas são e serão capazes de apagar cheiros e gostos, músicas, sorrisos, momentos… Algumas sensações continuam galopando desenfreadamente dentro do peito. E, por obra da sorte ou não, elas já são parte do que nos tornamos e vamos levando adiante.
Fim de ano é pra essas coisas… Para decidir, entre tudo que é perecível, o que fica conosco e o que vai para o lixo. Chegou a vez de jogar fora as flores secas que ficaram largadas pelos cantos da casa, varrer as tristezas, lavar os pratos com restos de frustrações. É hora de limpar cada decepção que virou pó e se acumulou durante esses meses. Agora é o momento de abrir as portas e janelas e deixar o vento novo entrar, circular, refrescar. Aquele cheirinho de azedo dos planos que mofaram nas gavetas precisa sair e dar lugar às novas promessas penduradas em lindas e coloridas molduras. Porque sonho é assim: se não ficar à vista, a gente esquece mesmo.
Sonhos que não se realizam vêm acompanhados, geralmente, de um mesmo sintoma: sensação de incapacidade. Mas, calma aí, a boa notícia é que pra isso tem cura! Em primeiro lugar, você tem que deixar o sol entrar. Em casa, em você, na sua vida. Porque se “o tempo é mercuriocromo”, o sol é o ácido que queima todas as angústias. Uma vez que ele esterilize todos os indícios de insuficiência, é hora de voltar ao parágrafo acima e, em porta-retratos, dispor os novos e antigos projetos.
É que são tantas coisas por fazer, tantas contas para pagar, tantos prazos a cumprir, que os sonhos ficam lá, quietinhos, feito cachorros esperando o dono junto à porta. Enquanto isso, eles dormem… Os mais animados se multiplicam! Sonhos são uma espécie de magia que nunca morre. Envelhecem, mas permanecem jovens. Não morrem jamais!
Por isso, eu te convido, neste fim de ano, a se desfazer de tudo que faz pesar seu coração. Livre-se do medo do que o outro pensa, da agonia de querer agradar a todo mundo, da dependência de um amor vampiro. Liberte-se do seu próprio personagem socialmente perfeitinho, da prepotência de estar sempre com a razão, da mania de achar imperfeições em tudo. Mande embora as suas cobranças, suas neuras e quem te disser que você não é capaz.
Encha, sim, o seu coração de amor, amor do bom. Carregue junto a ti os poucos e verdadeiros amigos. Fé, sempre, muita. Alegria de viver, de estar vivo, de ser o dono de sua vida. Sonhos de todos os tipos, cores, tamanhos e formas. Que os amores defuntos nos façam crescer e ter forças para seguir. E que os bons momentos se multipliquem no nosso céu estrelado!