Olha, cá entre nós, aqui nesse lugar somos todos prisioneiros. Todos. Cada um do seu jeito, estamos presos, amarrados, atados de alguma sorte. Enrolados de formas diferentes, mas todos, todos atrelados a suas próprias escolhas. Pode reparar.
Há os cativos de suas lembranças. Os detentos de suas saudades. Os que se deixam aprisionar por seus planos futuros e expectativas, os escravizados por seus medos, suas vontades e seus desejos. Os acorrentados a seus preconceitos e ideias fixas. Mas todos, todos estamos enlaçados. Alguns à espera, outros em busca. Parados ou em franco movimento, seguimos todos em prisão perpétua.
Desde os nossos compromissos mais corriqueiros, nossas prestações mensais, contas a pagar, dívidas de todos os portes até as obrigações inevitáveis da vida inteira, estamos todos aprisionados.
Contra isso não há o que fazer. Nossos cordões não se rompem nunca. Multiplicam-se para sempre. Novos e diferentes cordões umbilicais são tecidos a todo instante em fábricas fantásticas, onde operários incansáveis se revezam em turnos sequenciais, no ofício de tecer as cordas invisíveis que nos enredam, enveredam e comprometem.
Diga sim, não, talvez e você acaba de se prender a um novo fio, parte única de uma teia que nos mantém ligados e iguais. Responda nada, esconda-se no mais profundo silêncio e você também estará preso. Durma ou acorde, sente-se e espere ou levante e vá. Não importa. Nenhuma dessas opções mudará nossa condição essencial de prisioneiros enredados à teia espantosa da vida.
Até os mais livres, os que se gabam de não se deixar prender a nada, mochileiros, trabalhadores temporários, amantes de ocasião, volúveis de todos os gêneros. Esses também são meros detentos de seus próprios conceitos de liberdade. Os que acreditam estar aqui de passagem também não escapam: são eternos prisioneiros dos caminhos por onde passam.
Há os que voam, livres como aves migratórias, e também estão presos à impertinência de suas vontades. Todos, todos somos prisioneiros. Acorrentados como escravos a nossas opiniões e razões, arraigados a tradições familiares, medos antigos, necessidades de atenção, carências infinitas, desejos que se renovam. Estamos presos! Presos a tudo o que nos permita agarrar a vida e seguir em frente.
Não há o que lamentar. Nossos cordões são os vínculos que nos mantêm vivos. Disso ou daquilo, somos todos perplexos detentos.
No entanto, há entre nós um tipo diferente. São os prisioneiros da ternura. Os que choram de saudade, se comovem com as coisas belas, sorriem de lágrimas nos olhos com as lembranças simples, trabalham com empenho, erram com honestidade, tomam gosto de suas responsabilidades, observam a vida e participam de seu espetáculo como podem. A esses, ah… a esses está sempre livre, à espera, o melhor lugar do cativeiro. E para alguns deles, muito de vez em quando, encontra-se desimpedida, disponível e preciosa, a chave das grades.
Fotografia: Tri Joko.