Impossível não falar da pandemia neste Dia das Mães. Encontros, almoços, abraços, presentes. Nada disso é recomendado para o controle do Covid-19. A doença tem obrigado a sociedade a readaptar a rotina. Muitos entendem como passos para trás. Outros, uma chance de rever a vida.
Faço parte do segundo grupo. Com ressalvas. Ninguém me obriga — diria minha tia Quel — mergulhar em um poço de resiliência. Tenho natureza transformadora demais. Entendo aceitação como sabedoria para encontrar algo que pode ser feito. E alguma força para tolerar que jamais teremos controle de tudo. “Não precisa pensar em tudo” comenta tia Ritinha. Passei a infância vendo minha mãe, Lene, inventar pratos deliciosos com restinhos de comida. E ouvindo, “olhou com olho de achar?” Quando eu procurava alguma coisa. Entende? Gostaria de estar com todas elas. Não vai dar.
Então, minha gente, é isso. Teremos que reinventar uma das maiores tradições das famílias no mundo. Independentemente do seu entendimento acerca dos cuidados para evitar o contágio do novo Coronavírus. Você pode achar que é uma gripezinha ou ser daqueles que bebem álcool em gel. Fato é: todos estamos pensando sobre o encontro com nossas mães. Sejamos honestos. Encontrar as mães nessa data, levando ao menos uma lembrancinha, é obrigação social que a maioria de nós refletia e nem cogitava descumprir. Eu, ré confessa.
Aproveitando a oportunidade, então, cheguei a alguns apontamentos. Acho ótima ideia homenagear e ser homenageada. No meu primeiro ano como mãe, ganhei um vídeo feito pelo Fabrício, meu marido. Presentes me preenchem quando têm presença neles. Muitas vezes, o que se oferta são embalagens com produtos. Tanto que a data é o segundo Natal para os comerciantes. Sabe aquelas propagandas da relação da mãe em sua família cheia de afeto sem conflito? Com total dedicação e sem nenhuma opressão? Em um dia a dia mágico? Isso não existe. E mais: presente não é, necessariamente, demonstração de afeto. Mamães presenteadas podem estar descontentes ou simplesmente não curtirem um ritual de homenagem. Festas podem ser solitárias e silenciosas mesmo quando a mesa está cheia e há muita conversa. Um telefonema por ano não é relacionamento. Compartilhar exige entrega. Isso é feito no dia a dia. Sem padrões.
Sei que as mães são fundamentais. “A mãe é a primeira tradutora do mundo. E peça fundamental no tabuleiro da vida. A relação é bela e sempre delicada. Principalmente entre mães e filhas”, repete permanente minha analista, Silvânia. Ter um dia especial, ganhar presentes e fazer festa não é errado. Só não é obrigatório nem o único caminho de reconhecimento. Os desafios de ser mãe têm muitas particularidades. “Mãe só muda de endereço?” Que nada. Somos únicas e temos experiências diversas demais na jornada materna. Tem mãe de bicho, mãe de mãe, mãe de pai, mãe sem filho, filho sem mãe, pai que é mãe, mãe do mundo e por aí vai. Eu mesma passeio por muitos desses lugares. Tenho muito mais mães que as mencionadas nesse texto. Sou livre até para não transitar na maternidade em alguns momentos. Reconheço como meu compromisso mais desafiador é manter-me sempre mãe de mim. Antes de mais nada. E só consigo ser mãe de Liz porque minha mãe me deu presença de presente. A vida toda.