No dia em que eu nasci, a música mais tocada no mundo era “Help”, de Lennon e McCartney. Isso explica muita coisa, embora, não explique coisa alguma. Puro acaso. Com um pouquinho mais de álcool na cabeça, isso daria um blues. Ou uma enxaqueca. Dor já existe o bastante. Se não tivesse chegado, neste instante, do funeral de uma linda mulher, comporia uma canção. Na pior das hipóteses, escreveria um conto desgraçadamente realista, como fez Charles Bukowski, um dos maiores filhos-da-puta que se tem notícia na literatura mundial.
Foi um câncer que ceifou a vida do Hank, o Velho Safado. Do que morreu a moça? Atentado terrorista. Avião que era, foi abatida, em pleno voo, por um míssil iraniano. Mentira. Tudo mentira. Ninguém mais diz a verdade: nem eu, nem os norte-americanos, nem os fanáticos fundamentalistas que atiram mísseis para onde o nariz aponta. E que narigão eles têm. Guerra é guerra. Minha arma é o sarcasmo; minha munição, a ironia. Mas que a moça morreu, morreu. Acidente com um piano.
Tenho 54. Calma lá, não se animem. Não falo dos centímetros do falo. Não é nada disso. A MPB sempre foi bem-dotada de ótimos letristas. Fui criado a mingau de aveia e música de primeira. Devo isso aos meus pais, que me afastaram do caminho de drogas como a lambada e a música brega. Os jovens compositores dos anos 1960-1970 tinham muito a dizer. Por meio da criação artística, carregavam as bandeiras da rebeldia e da irreverência, aquela vontade incontida de transformar o mundo, abordando temas existencialistas de alta relevância que parecem ter evaporado da mente criativa dos atuais compositores brasileiros, muitos dos quais não fazem outra coisa senão rimar amor com dor, falando dos sentimentos afetivos da forma mais piegas possível.
Eu, um expert? Um profissional da música? Não. Nem profissional do sexo, tampouco. Também odeio vocês, haters. Sou um aficionado, um viciado em música que anda deveras preocupado com os rumos da nova música que se faz no Brasil, principalmente, no que tange ao conteúdo das letras. Tenho a péssima sensação de que vivemos uma entressafra criativa, um estio longevo que resulta em mediocridade. Não sei aonde a MPB vai dar. É óbvio que existem exceções. Nem tudo está fodido. Dá para contar nos dedos de uma mão uma meia dúzia de gatos pingados compondo com muito esmero e qualidade. Sim, sou aleijado, nasci com um dedinho sobressalente. Enfiá-lo-ei no seu…
Bem, vamos manter a falta de classe. Você pode até dizer que eu tô por fora ou, então, que eu tô inventando. Acho que o cearense Belchior, um dos maiores poetas do nosso cancioneiro, concordaria comigo, se ainda estivesse vivo. Na mesma linha de pensamento, não tem muito tempo, o cantor e compositor Milton Nascimento perdeu as estribeiras ao afirmar que a música que se faz hoje no Brasil está uma merda. Se o Milton fala de cátedra, quem sou para discordar?
Instigado por doses cavalares de indignação e impaciência com os nhe-nhe-nhens cantados como se fossem pérolas da maior grandeza, bati à porta do covil do meu editor-chefe na Revista Bula e propus, com uma pistola apontada para a sua têmpora, uma pesquisa de opinião entre os leitores das redes sociais da mesma — que não são tantos quanto se imagina; a maior parte restringe a leitura às fotografias — a fim de elencarmos os maiores letristas da música popular brasileira em todos os tempos. Mesmo sendo um fã declarado dos garotos do Backstreet Boys, que hoje já são marmanjos bem crescidinhos, o sujeito autorizou a iniciativa. A pesquisa foi feita e ficou assim a lista dos mais notáveis poetas da MPB. Aceito as críticas de qualquer pessoa, desde que ela não redija a palavra “impressionante” com a letra “c”, conforme fez o Ministro da Educação.
Fotografia: Benjamin Kralj — Shutterstock
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