A obra de Hannah Arendt é cada vez mais influente e engana-se quem pensa que sua filosofia — por ser lida e discutida de maneira ampla — é superficial. Na verdade, é densa, mas, como escreve com clareza, é mais bem compreendida e estudada do que, por exemplo, Kant, um filósofo, a rigor, mais filósofo-filósofo. A judia alemã é uma filósofa-ensaísta e, nos seus estudos mais pesados, filósofa-filósofa. Como debateu a política — estudou detidamente o totalitarismo nazista e o totalitarismo comunista —, a academia apropriou-se de suas ideias, nem sempre com a precisão esperada. Fica-se com a impressão de que há várias Hannah Arendt, dependendo de quem está apresentando suas ideias. Se for um marxista, a autora de “A Condição Humana” se torna praticamente uma marxista — o que, claro, não era. Liberais tentaram transformá-la em liberal, o que não era. O que, então, Hannah Arendt era-é? Ah, sim: Hannah Arendt — é uma, por assim dizer, democrata radical.
Se no mundo acadêmico Hannah Arendt é ampla e merecidamente estudada, o que parece despertar o interesse do público é seu ensaio “Eichmann em Jerusalém — Um Relato Sobre a Banalidade do Mal” (Companhia das Letras) e, sobretudo, a história de sua paixão por Martin Heidegger, o mais importante filósofo alemão depois de Kant.
Há biografias de qualidade que destacam o caso entre Hannah Arendt e Heidegger, apresentando-o de maneira correta, e não como fofoca. A autora de “Entre o Passado e Futuro” foi discípula, mesmerizada, e amante, apaixonada, do autor de “O Ser e o Tempo”.
“Hannah Arendt e Martin Heidegger — História de um Amor” (Perspectiva, 416 páginas, tradução de Luis Marcos Sander), de Antonia Grunenberg, é, tudo indica, obra de caráter sério. A editora informa: “O mais conhecido e comentado romance da história da filosofia trazido ao público em todos os seus detalhes, iluminando a trajetória de dois dos mais influentes pensadores da atualidade. A autora consegue a proeza de contextualizar filosofia, política, limites éticos e, naturalmente, o amor com rigor e imparcialidade. Traz a atmosfera de grande ebulição criativa e de extrema polarização política de um dos séculos, o século 20, de maior desenvolvimento e cooperação na cultura e na ciência e de maior letalidade em conflitos armados”.
O que importa? Apesar da paixão, Hannah Arendt e Martin Heidegger não pensavam da mesma forma. Eram e permanecem diferentes.