A contar pelos comentários raivosos que espocaram nas redes sociais nas últimas semanas, concluo que a maioria dos leitores de internet anda odiando quase tudo o que eu escrevo. A maior parte simplesmente não suporta ler a partir do título, sequer atinge o segundo parágrafo, mesmo assim, detesta, não somente os textos, mas, o autor. Jesus te arma; eu, não. Acho que, finalmente, acertei a mão e estou no caminho certo, pelo menos, em termos literários.
Eu te amo. Desde 1986 que eu te amo. Tum! Aquela bola na trave e o Brasil eliminado pela França nas penalidades máximas. O mínimo que eu podia fazer era beber com os amigos para afogar as mágoas. Jovens tristes e magoados eram uma raridade naqueles dias. Hoje, pulam aos montes das sacadas dos prédios, num aparente surto de vazio existencial. Para eles, o fim da picada. Para nós, o começo: aquele encontro no bar. Quartas-de-final. Estádio Jalisco. Caímos em desgraça por honra e mérito do goleiro francês que tinha catado um pênalti do Zico durante o tempo regulamentar, mesmo possuindo um só dos testículos. Isso é que era ter um colhão. Embriagávamo-nos com vodca e Fanta. Só de pensar, a minha boca enche d’água. Náusea.
Tem gente que me provoca náusea. Meu estômago embrulha sempre que eu cruzo por fascistas fanfarrões. E eles são muitos, autoconfiantes, falam pelos cotovelos e se reproduzem mais lépidos do que larvas de mosquito. Pensei que estivesse dengoso. Mas, a febre era só raiva. Cogitei adotar um taco de beisebol para me proteger dos patriotas hard-core, mas, esse tipo de jogo simplesmente não me leva a nada. Todos perdem com a violência, principalmente, a madeira-de-dar-em-doido. Estou desmatando as pessoas tóxicas do meu convívio.
É pura força de expressão. Espero nunca passar pelo dissabor de matar uma pessoa. Deixo para os justiceiros extremados a minha cota-parte do direito de andar armado. Foi puro sex appeal. Eu não te amei desde o começo. O amor foi tomando corpo com o passar do tempo, até culminar em filhos. Foi muito melhor tê-los, não resta a menor dúvida. Reconheço que demos certo. Felicidade a dois, é o que dizem por aí. Ninguém é perfeito. Temos também os nossos altos e baixos. Eu por cima. Você por baixo. E vice-versa. Amor. Futebol. Carreira. Política. Religião. Desesperança. É tudo parte da mesma coisa.
Cada um tem a sua parcela de contribuição para o caos diário de um país subdesenvolvido, inclusive, os neutros. Negligência é foda. Eu quis transar com você desde a primeira vez que te vi. Garotos são afoitos. Gametas são intrépidos, você sabe. Foi muita sorte ter te conhecido. Amor. Sacanagem. Fecundação. Os partos. Nada é mais comovente do que uma mulher que desova as crias pelas próprias entranhas. A vida é estranha. Dádivas. Mistério profundo. Nascemos. Crescemos. Fodemos. Sorrimos. Procriamos. Provemos os filhos com uma gana nunca antes imaginada. Um roteiro repetido desde que o homem perdeu a cauda e saiu da água para povoar o planeta.
Cá estamos, às vésperas da primavera de 2019. Às vezes, parece que não, mas, de um jeito ou de outro, a humanidade acaba sempre evoluindo. Foi assim conosco. Um afeto crescente que começou há 33 anos, quando aquela bola do zagueiro Júlio César acertou a trave do Bats, o herói roncolho. Foi aí que os nossos olhares se acertaram. Mesa de bar. Vodca com Fanta. Paralamas tocando. Um clima amistoso, apesar da decepção canarinha. Sorte de uns. Azar de outros. Como diriam os franceses, sempre atravancando o nosso caminho: C’est la vie. Enfim, eu te amo. Desde 1986 que eu te amo.