Seria o Flamengo tão grande quanto sua torcida pensa? A resposta é não

Seria o Flamengo tão grande quanto sua torcida pensa? A resposta é não

Apontar qual seria o maior clube do Brasil é uma tarefa hercúlea. Isso porque há, envolvidos nesse processo, inúmeros e complexos fatores impedindo que se estabeleça um critério perfeito e imune a críticas para se chegar a um veredito aceitável. Existe, por óbvio, uma elite de times tradicionais, restringindo o número de candidatos pela hegemonia histórica. Dentre eles está o Flamengo, aclamado por sua torcida e por muitos setores da mídia. A partir desse pressuposto, abre-se a grande questão: seria o Flamengo um time realmente tão grande quanto se propaga?

Como primeiro ponto, seria leviano — e um desconhecimento futebolístico absurdo — não definir o Flamengo como um dos maiores times do Brasil. Os mais respeitados institutos de pesquisa indicam que ele é o clube preferido dos brasileiros. Além da popularidade, o Flamengo possui títulos no cenário nacional e internacional, que em nenhuma hipótese podem ser desprezados.

Estrutura

A estrutura do clube atualmente é de primeiro mundo. O Centro de Treinamento George Helal, carinhosamente apelidado Ninho do Urubu, é referência, e suas instalações não deixam nada a desejar aos clubes europeus. Conta com dois grandes prédios, 24 suítes equipadas, campos normais e para treinamento de goleiros, piscinas oficiais e muitos outros atrativos. Todavia, ter uma estrutura boa é algo bastante vago para se definir se um clube é grande ou não. Naturalmente, um clube grande tem uma boa estrutura, dando plenas condições aos seus atletas. Mas isso, por si só, não é suficiente para consolidar alguma agremiação no rol dos maiores. O fato de o Flamengo não ter estádio próprio, por sua vez, também não o afasta do patamar de grande. Basta lembrar que Milan e Inter de Milão não possuem estádios e são gigantes europeus.

Torcida

Como já dito, o Flamengo, segundo os maiores institutos consultivos, possui a maior torcida do Brasil, ultrapassando 30 milhões de seguidores. O número é bastante significativo, representando quase 18% dos torcedores nacionais. É o time das massas, e joga praticamente em casa do Oiapoque ao Chuí. Uma crítica que recebe é pelo fato de boa parte da torcida de fora do estado ser composta por mistos, que são torcedores que possuem dois ou mais clubes como preferidos. Segundo o “Datafolha”, as regiões Norte e Nordeste dão a liderança ao Flamengo, já que há um empate técnico com o Corinthians na margem de erro. Na região de ambos, o Sudeste, o Corinthians ganha com certa folga a preferência dos torcedores (19% contra 14%), enquanto no Norte, por exemplo, há uma discrepância incrível (37% de flamenguistas contra 8% de corintianos). Como nesses estados boa parte da amostragem também torce por times locais, há essa peculiaridade de adeptos com mais de um time, o que, claro, não muda o fato de o Flamengo ser o mais querido.

A massa de flamenguistas no País pode ser explicada pela transmissão dos jogos nas redes de rádio e televisão. A popularização do Flamengo como parte da identidade do brasileiro começou nas décadas de 1930 e 40, com um trabalho de marketing do próprio clube, desenvolvido com primor pelo presidente José Bastos Padilha e propagado pela imprensa. Nota-se que a adesão das camadas populares de outras regiões à preferência pelo rubro-negro carioca deveu-se ao fato de que muitas delas recebiam as transmissões do campeonato carioca, em detrimento de seus próprios estaduais, até meados da década de 2000. Isso criou uma massa de fissurados pelos times do Rio de Janeiro, influenciando sobremaneira a preferência dos torcedores desses locais, até por questões de proximidade e conforto. É mais fácil, ainda hoje, um torcedor do interior da Bahia assistir a um jogo do Flamengo pela televisão do que a um do Vitória, por exemplo.

Poderoso esquadrão

O grande período do Flamengo foi o dos anos 1980. Ali o Flamengo garantiu suas maiores conquistas, e chegou a um apogeu determinante para a sua consolidação no imaginário popular como grande vencedor. Nesse período, foram conquistados nada menos do que três campeonatos brasileiros, em um intervalo de quatro anos (1980-1983), uma Copa União (1987), uma Libertadores e um Mundial de Clubes (1981).

São Paulo
Mesmo o melhor dos Flamengo da história não se compara a clubes como ao São Paulo multicampeão de 1993

O lendário time de 1980-81 contava com Raul, Mozer, Júnior, Adílio, Andrade, Nunes e Zico. Não dá para estabelecer uma comparação entre times de épocas distintas, mas esse esquadrão se compara aos maiores times da história do Brasil, ao lado do Santos de Pelé, Coutinho, Mengálvio, Dorval e Zico; do São Paulo de Telê, Raí, Müller, Válber, Cafu e Zetti; do Botafogo de Garrincha e do Palmeiras da era Parmalat. A diferença, para os dois primeiros, reside no fato de que aquelas foram equipes bem mais vencedoras internacionalmente. O Santos foi bicampeão brasileiro, da Libertadores, do Mundial e excursionava pelo mundo em torneios amistosos derrotando gigantes como o Real Madrid. Já o São Paulo emplacou três finais de Libertadores seguidas — vencendo duas delas —, foi campeão brasileiro, bicampeão mundial, da Recopa, campeão da Supercopa e de outros torneios internacionais. O Flamengo, nesse ponto, estacionou nos títulos conquistados em sua única jornada internacional, em 1981.

Rebaixamento

O Flamengo nunca foi rebaixado. Desde que foi fundado, em 1895 — apesar de o departamento de futebol iniciar os trabalhos apenas em 1912 —, o time jamais disputou partidas pela segunda divisão de qualquer torneio. Disputar uma divisão de acesso, saindo da elite do futebol, é, sem dúvida, um marco negativo na história de qualquer clube. E essa vergonha o Flamengo não tem em seu currículo. A despeito disso, algumas vezes o time passou por apertos e por pouco não caiu. Em 1995, ano de seu centenário, e quando formou o autoproclamado “melhor ataque do mundo” (com Sávio, Romário e Edmundo), teve um desempenho pífio e bateu na trave da série B. Também fez campanhas terríveis nos brasileiros de 2001, 2004 e 2010. Em 1933, foi o último colocado no Campeonato Carioca. Porém, de fato, o Flamengo jamais desceu de divisão. Ponto para o clube carioca. Contudo, vale destacar que rebaixamento, em si, também não é ponto chave para definir grandeza. Afinal, times gigantes como River Plate, Bayern, Liverpool, Corinthians e Internacional já foram rebaixados, e não deixaram de ser grandes por essa razão. Na verdade, é uma ostentação que vale mais como provocação entre torcidas, mas que não deixa de ser um feito do clube. 

Títulos

Nos domínios nacionais, o Flamengo se destaca. Após afastar o rótulo de time regional e conquistar o Brasileirão de 1980 em cima do Atlético, a equipe colecionou grandes conquistas. É pentacampeão brasileiro (o STF reconheceu o Sport como legítimo campeão de 1987) e tricampeão da Copa do Brasil. Com a ratificação dos torneios pré-1971, o Flamengo deixou de figurar entre os maiores campeões nacionais. Nos quesitos Brasileirão e Copa do Brasil, foi superado por Palmeiras (10-3), Corinthians (7-3), Santos (8-1) e Cruzeiro (4-6). O rubro-negro é o time com mais títulos cariocas (35) e possui apenas um título no torneio Rio-SP, de 1961. No geral, o Flamengo, com suas taças, ocupa a sexta posição no ranking da CBF, sendo um dos maiores do País. 

Títulos internacionais

Aqui parece ser o calcanhar de Aquiles do Flamengo. O rubro-negro tem em sua coleção de títulos um Mundial de Clubes, uma Libertadores e uma extinta Copa Mercosul. Está no restrito grupo de equipes vencedoras de Mundial e Libertadores. Porém, dentre os grandes brasileiros, perde para todos os times de São Paulo em quantidade de títulos internacionais. Além deles, Inter (2), Grêmio (3) e Cruzeiro (2) possuem mais Libertadores que o Flamengo. Corinthians, Vasco e Atlético Mineiro empatam com ele. Depois de seu único título, por sinal, o Flamengo colecionou fracassos no torneio sul-americano: foram cinco eliminações na primeira fase e quatro nas oitavas de final. Para um clube que sempre gera expectativas, é uma grande decepção. O time chegou a apenas uma final na história. Em 2002, até mesmo o São Caetano disputou uma final de Libertadores. Desde o ano de sua conquista sul-americana, por sinal, o Flamengo carrega uma grande polêmica: no jogo de volta contra o Atlético, houve cinco expulsões, com um resultado bastante contestado.

Pode-se dizer que o Flamengo é um grande ganhador dentro de seu território, mas que não consegue alcançar o mesmo desempenho internacionalmente. Na soma geral internacional, perde para o São Paulo (13), Santos (8), Internacional e Cruzeiro (7), Grêmio (6), Corinthians e Atlético (4). Para se ter uma ideia, com seus títulos recentes, Atlético e Chapecoense se aproximam do Flamengo em quantidade nesse ranking.

Conclusão

De uma forma bastante objetiva, pode-se dizer que, independente dos critérios utilizados, o Flamengo é um gigante nacional. Grandeza não se faz apenas de concreto ou contemporaneidade, mas sim de tradição, história, títulos e seguidores. E tudo isso o Flamengo tem de sobra. Se a questão passar pela representatividade, sem dúvida, o Flamengo é um clube do mais alto patamar, ao lado do Corinthians. São dois times de massas, que movimentam multidões onde quer que joguem.

Em se tratando de conquistas, o Flamengo possui um desequilíbrio histórico: apesar de taças levantadas dentro do Brasil, deve muito internacionalmente, não passando nem perto dos times mais ganhadores fora do País.