Feio, sujo e malvado Troubles fear of laugh. Indoor shot of carefree attractive easter guy with curly hair and beard showing tongue and making funny face while standing over gray background, fooling around.

Feio, sujo e malvado

Toquem fogo nos cabarés. O que dizem por aí a respeito de Miriam Porquinhos-da-Índia é pura balela. Esta senhora jamais foi torturada. Se muito, foi convencida pelos alicates das Farsas Armadas de que amar o seu país é muito mais importante do que amar a si mesma. Essa coisa de penicilina, de ditadura, de Terra redonda, de homem pisando na lua, isso nunca aconteceu. Sim, nós tergiversamos. República dos Imolados acima de tudo; Trovão acima de todos.

A mim, pouco importa se ela teria abortado por conta do coice de um sargento ou se vai chover mais tarde. Ateus nunca deveriam procriar. Quem está numa guerra é para isso mesmo: matar. A não ser nos casos de suicídio — ato extremado que exige máxima bravura e merece o todo nosso reconhecimento — não existe fair play ao se apertar o gatilho. Está escrito nas almanaques sagradas, “Só se entra no céu, morto”. Estamos apenas seguindo os princípios religiosos básicos ao mandar os nossos inimigos para o quinto dos infernos.

Meu filho? Meu filho não. O meu primogênito é um bom garoto e será o nosso adido militar em Pasárgada. Lá somos amigos do rei. Poesia? Ora, literatura é bitolação. Dança é para mulheres. Teatro é coisa de veado. Artes plásticas só servem para poluir os rios e os mares do planeta. Cinema? Cinema não enche a barriga de ninguém. A Lei Lumière já era. Acabou a mamata. Só vai mamar nas tetas do erário quem a gente permitir. É uma questão de prioridade. Até porque não existe fome no país. Os miseráveis — eles nem são tantos assim; dá para lhes cortar os dedos — estão só fazendo dieta. Fome pra valer só existe em Antares. Aliás, deveria acontecer alguma espécie de incidente em Antares, para dizimar os famintos.

Não respondo perguntas difíceis a essa hora do dia. Vocês só sabem criticar o desgoverno. Um dia ainda acabam calados. Não pouparemos esforços para colocar os cadáveres nos trilhos, combater a liberdade de expressão e os baixos índices de patriotismo no sangue. Eu vi a cara da morte e ela chorava de medo. Eu renasci das tripas com a missão de cagar com tudo e moralizar a República dos Imolados. Começaremos desmoralizando todos aqueles que pensam em contrário. Contra facas não há argumentos. Eu que o diga. Trespassaram-me com uma espada de São Jorge. Detesto plantas, já deu pra notar. Por onde vocês andavam enquanto eu imitava zarabatanas com os braços estendidos para o alto, durante a minha internação compulsória num leito do manicômio oficial?

Não importa qual seja o convênio, hospício é coisa de doido, podem ter certeza. A loucura mata mais do que o trânsito. Por isso mesmo, estamos até sendo lenientes demais ao flexibilizar o coito-sem-fins-reprodutivos dentro dos Vemaguet, sem o uso obrigatório dos cintos-de-castidade, desde que o ato sexual aconteça entre um homem e uma mulher, preferencialmente, na clássica posição do papai-e-amante de que tanto falam as novelas das 7. Comam pelo rabo as deputadas federais que não merecerem ser estupradas. Se elas vão ou não vão gozar no final, não é problema do governo. O que importa mesmo é acender o bom e velho Jeronimo’s. A Bolsa de valores agradece. Cigarro provoca câncer? Quem pode garantir? Isso não passa de intriga da oposição. Da mesma forma que o desmatamento da Cava-Funda Legal e a liberação de pesticidas dentro das igrejas. Como diria Mark Chapman, um dos maiores visionários da humanidade, imaginem o mundo sem a Taurus. Vocês podem dizer que eu sou um mentecapto, mas, não sou o único.

O fato é que estamos vivendo uma nova era na República dos Imolados. Pode até ser a última. Que se dane. A nação é nossa. Fazemos dela o que bem entendermos. Com a graça de Trovão. O que conta, no final, é que a nossa verdade prevalecerá. Se ela vai nos redimir é outra história. Afinal de contas, eu nunca quis ser presidente mesmo. Eu nasci para ser boçal.    

Eberth Vêncio

É escritor e médico.