Hoje, Dia dos Namorados, resolvi revirar meu passado. Guardo, numa velha pasta escondida, as lembranças de um tempo vivido. Remexer é recriar. Reviver. Ressignificar dores e amores adormecidos. Encontrei várias fotos. Lembranças de momentos. Não, não os havia esquecido, apesar de não estarem presentes no meu cotidiano. Escolha? Obrigação? Necessidade? As fotos eram de antigas namoradas. Antigos amores. Paixões. A mais recente me causa dor. Ainda não foi esquecida para ser carinhosamente lembrada. Os sentimentos são reminiscências saudosas. Porém, de que me servem agora estes sentimentos, este amor pelo passado e pela lembrança? Poderia colocar essas fotos em um mural no meu quarto? Namoros e amores do passado? Este mural de ex-amores seria aceito pelos atuais companheiros das minhas ex? Qual é o sentido de reviver algum amor do passado?
As fotos marcam momentos que estão extintos no tempo. No espaço. Na distância. No momento mesmo em que elas foram tiradas já se tornaram passado. Relíquia. “A fotografia é uma testemunha, mas é uma testemunha do que já não existe. Um flerte com a morte.” Visualizar é colocar em foco. É ter novamente flashes dos fatos. Da história querendo ser recontada e reescrita. São fotos dos amores juvenis e dos amores maduros. São fotos tiradas em bons momentos. Nos melhores momentos. Nos melhores instantes. Alegria. Amor. Plenitude. E eu os sinto agora. Com uma saudade, triste e alegre. Triste porque se acabaram. Como tudo se acabará. Alegre por terem existido. Ou por achar que existiram. Esses momentos são agora mais vívidos do que estas palavras que escrevo?
Para escrever meus versos, precisei viver ou imaginar que vivi. Para viver esses momentos, precisei que outros amores tivessem se juntado em minha vida. Será que elas têm as mesmas lembranças? Será que elas têm as mesmas fotos? Será que elas têm outras fotos, que remetem a outras lembranças, que eu não tenho? Que nunca mais terei? De que vale ter vivido e não lembrado, ou lembrar e não viver? As fotos estão aí. Lembro-me de tê-las tirado? De tê-las vivido? Mas agora, nesse agora que também se extingue, o que elas representam? Lembranças, histórias, memórias. Eu reconto e recrio as fotos com meus olhos de hoje. Com lágrimas, lembro um passado que pode ter existido. Ou não. O mundo da explicação e da razão não é o da existência. Em que mundo existe — existo — essas fotos? Evoco. Evoco-as agora. Reconstruo.
Neste tempo literário, o que representa uma fotografia? O que representa a lembrança do amor — fim da inocência? Sim, o fim de tantas inocências. E também dos momentos lindos que passaram, que viraram prosa, poesia e literatura. Agora elas não passam de fotos desbotadas. Rasgadas. Cinzas de um amor.
Mas os momentos e os amores estão em mim. Perdurarão enquanto minhas palavras insistirem em falar e minhas emoções não desistirem de existir. Estão no mural da minha mente. Cutucando meu coração. Rebulindo minhas emoções. Vivos e vívidos. Falseados. E assim permanecerão por mais algum tempo. Até que novos surgirão. Fotos delas com outros, e fotos minhas com outras… em um outro Dias dos Namorados.
Jacques Fux: vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura 2013 com o livro Antiterapias. Autor de: Brochadas: Confissões Sexuais de um Jovem Escritor, Rocco, Meshugá: Um Romance Sobre a Loucura e Nobel, publicados pela Editora José Olympio/Record.