Acabo de rever o filme “As Pontes de Madison” (1995), com a dupla Meryl Streep e Clint Eastwood. Clint é também o diretor. Filme romântico tão delicado que faz a gente pensar como o mesmo ator que faz o casca-grossa Harry Callahan tem uma sensibilidade tão grande, capaz de expressar sentimentos tão delicados. Meryl é maravilhosa, e a gente consegue traduzir o que ela está pensando, sem que diga uma palavra.
Deve ter sido a quarta vez que assisti ao filme, mas parecia que o estava vendo pela primeira vez. Um bom filme é como um bom livro. Ele se revela a nós aos poucos, por camadas de apreciação. Por isso eu gosto de reler bons livros e de rever bons filmes.
Mas eu quero falar mesmo é da cena do primeiro beijo, entre Clint e Meryl. É tão bonita, tão expressiva, que me lembrou a cena do beijo entre Ingrid Bergman e Gregory Peck, em “Quando Fala o Coração” (1945). Hitchcock, o diretor, um gênio, mostra o beijo e, em seguida, uma sequência de portas que se abrem uma dentro da outra, outra dentro da outra… Grave bem isto: um casal se beija e portas se abrem.
No final da década de 1980, eu estava de férias no Rio de Janeiro e vi no jornal que um canal de TV (não me lembro bem, mas acho que era a TV Corcovado) ia exibir “Quando fala o Coração”, que eu ainda não tinha visto. Depois do filme, haveria um debate com vários críticos de cinema. Programa que, quem me conhece sabe, eu não perderia por nada deste mundo.
O filme terminou de madrugada. Ainda assim fiquei atento ao debate, e ouvi o maior disparate que um crítico de cinema poderia dizer. Um dos críticos disse que Hitchcock não se preocupava com o sentido de uma cena, só com a sua beleza. E citou a cena do beijo. Segundo ele, aquelas portas se abrindo não tinham nenhum sentido, era apenas uma imagem bela. Eu concluí que aquele crítico não era do ramo, pois certamente nunca tinha beijado uma mulher na vida.