— Eu te amo.
— Sinto muito.
— Você precisa me perdoar.
— Não há o que perdoar.
— Pense nos nossos filhos.
— Foi justamente pensando neles que eu cheguei à conclusão que precisamos dar um tempo. A gente não consegue mais conversar sem levantar a voz.
— E Damian? Você matou o nosso pequeno Damian.
— Isso não vem ao caso. Damian será para sempre o meu principezinho. Nunca mais diga isso, por favor. Não seja cruel.
— Olha só quem está falando de crueldade.
— Foi um acidente e você sabe muito bem disso.
— Você precisa me amar, porra!
— Não grita. Vai assustar as crianças.
— As crianças estão dormindo.
— Vai dormir também. Já é tarde. Estamos todos cansados, dizendo coisas desagradáveis um para o outro. Amanhã continuamos.
— Amanhã… Amanhã… Sempre adiando as coisas. Preciso tomar alguma coisa hoje e agora. Beba comigo. Por favor. O que você quer: Cuspe? Breja?
— Apague o Jeronimo’s. Não gosto quando você fuma dentro de casa.
— O que vai ser, baby?
— Cuspe. Me serve um Cuspe. Uma pedra de gelo.
— Uma pedra de gelo. Que frieza a sua. Parece mais um iceberg montado em duas pernas.
— Você ainda não viu nada. Isso é só a ponta. A parte principal está submersa aqui dentro do meu peito.
— Não me venha com as suas metáforas de merda. Isso aqui não é mais um daqueles seus poemas ridículos. Você me dá nojo, sabia?
— Taí um bom motivo pra gente se separar.
— Isso não é justo. Dou um duro danado em prol desta família. Pensei que o nosso amor fosse para sempre.
— Nem os diamantes são para sempre.
— Por que você tá fazendo isso agora? Tá brincando comigo. Eu não sou seu joguete.
— Não estou jogando com você. Estou apenas reconhecendo que já chegamos ao fim. Estamos salgando carne estragada. Não dá mais pra engolir. Acabou, entende?
— Tem outra pessoa. É isso. Tem outra pessoa nessa história.
— Não. Não tem outra pessoa. Para com isso.
— A casa. Eu quero a casa. Não abro mão dessa casa. Ralei a vida inteira pra ter um lar.
— A discussão não é essa. Pensei que, talvez, fosse melhor que as crianças continuassem morando com você, sabe como é…
— Quero a picape também e as nossas ações na Drug of Life.
— Vamos resolver tudo isso com calma, no seu devido tempo, de boa. Ninguém vai sair perdendo.
— Você perdeu, trouxa. Você já perdeu, amorzinho. Tá na cara que você perdeu. A derrota está estampada na sua testa em letras garrafais: “Eu perdi”.
— Por favor, não grite. Acalme-se. As crianças estão dormindo.
— Vai se danar!
— O que é isso? Onde foi que você conseguiu esta arma? Isso é loucura.
— Você não queria conversar? Então, vamos conversar. Estamos aqui só conversando, meu amor.
— Você vai amedrontar as crianças. Por favor, abaixe essa arma.
— Elas estão dormindo. As crianças estão dormindo. Todas as crianças da porra dessa casa estão dormindo; a não ser, Damian, que você matou.
— Foi um acidente. Vai. Me entrega logo essa arma. Vamos nos acalmar.
— Eu te odeio.
— Jesus…
— Quanto cinismo da sua parte, não? Pensa que vai se livrar assim tão fácil?
— Por favor, guarda essa arma. Vai ficar tudo bem.
— Não. Não vai ficar tudo bem. Só vai ficar tudo bem depois que eu puxar o gatilho.
— Não diga isso. Pense nos nossos filhos.
— Nossos filhos estão dormindo, cacete! Não foi você mesmo quem disse isso? Os nossos filhinhos estão dormindo nas suas caminhas. Todos eles, exceto, Damian.
— Se estivesse vivo hoje, Damian não aprovaria o seu comportamento.
— Ora, até que a morte dele não foi em completamente em vão, certo? Você tá me enlouquecendo.
— Espera um pouco aí. Eu te amo. Esqueça tudo o que eu te disse. Você tem razão. Aonde é que eu estou com a cabeça? Eu te amo muito, muito, muito. Sempre te amei. Você é o grande amor da minha vida. Por favor, não atire.
— Tarde demais pra chorar, gracinha.
— Não faça isso comigo. Eu peço perdão. Para.
— Feche os olhos, faça um pedido e conte até três.
— Por favor, não faça isso, tem as crianças e…
— Adeus, benzinho.
Deu um tiro na própria boca, encerrando a conversa. As crianças acordaram pedindo mamadeira.