Eu não suporto essa mania dos blogueiros escreverem tudo na primeira pessoa. Inclusive, porque a mania deles está virando uma tendência perniciosa até no mundo literário. Dificilmente eu vejo um texto deles na terceira pessoa. É tudo “eu, eu, eu” — num impressionismo sem precedentes em nossas letras. “Eu viajei para a Lapônia”, “eu experimentei um incrível aparador de bigodes e cavanhaques”, “eu tenho dez dicas infalíveis de como não levar um fora na balada” e por aí vai.
Outro dia eu achei um aplicativo que busca sites e blogs aleatoriamente. Cliquei para ver onde ele me levaria. Pronto, cai na página de um cidadão que contava suas impressões como cultivador de escargots. Na primeira pessoa, evidentemente. Neste caso até se justificava, um escargot virar personagem é algo surreal, ainda mais se fizesse monólogos interiores. Mas a regra é sempre a mesma: o “eu” é imperativo.
Eu até acho que num conto, numa novela o uso do eu pode ser interessante. Casa muito bem com narrativas realistas, mas que, no fundo, são fantasiosas. Como bem fazia um Kafka e seus seguidores, se é que Kafka deixou seguidores. Eu não acho. Mas talvez para esse fim fosse válido o uso deliberado do “eu”.
Entretanto, eu prefiro mesmo quando alguém, mesmo num texto mais ligeiro de blog, mostra que sabe fazer uso de todas as teclas disponíveis. E acaba compondo algo mais abrangente. É claro que a crônica, se comparada à música erudita, seria um lied, não uma sinfonia.
Mas ainda assim há lieds e lieds de Beethoven. Eu pelo menos penso assim. Quando estou eu, comigo mesmo, escrevendo um texto penso se não posso transformar aquela minha opinião pessoal num discurso indireto livre. Mas, pra esses impressionistazinhos de plantão, meter seu ego em tudo é automático.
Eu, por mim, não deixaria publicar mais um livro sequer se viesse nesse formatinho percorridíssimo. Ou o escriba mostrava que sabia escrever de maneira mais canônica ou eu simplesmente deixaria suas ideias mofando.
Eu sei que isso talvez trouxesse uma grita no mundo dos blogs e no mercado editorial. Eu imagino que também pudessem me acusar de castrador. Eu sei disso tudo. Mas, por outro, eu sei que isto poderia ser a única maneira de conter a verdadeira onda de artigos, crônicas, contos, novelas e romances em tal padrão preguiçoso.
Os seus defensores dizem que usar a terceira pessoa deixa o narrador onisciente em excesso e, por conseguinte, falso e autoritário. E o “eu”, é o quê? Uma forma de narrar democrática e pluralista? Eu acho que ela, na verdade, é a forma mais arrogante, simplória e beócia de se produzir material de leitura.
Eu queria ver um desses espancadores de caracteres de agora conseguir contar suas experiências em diversas dimensões. Mas, por hora só consigo afirmar uma coisa: eu odeio todos esses textos na primeira pessoa. Eu e pelo jeito mais ninguém. Mas eu me basto.