Better Man: mal saiu dos cinemas, já chegou ao Prime Video — e é um dos melhores filmes de 2025 Divulgação / Sina Studios

Better Man: mal saiu dos cinemas, já chegou ao Prime Video — e é um dos melhores filmes de 2025

Há artistas que se tornam símbolos de seu tempo, mas há aqueles que desafiam o tempo, não por sua permanência nos holofotes, mas pela honestidade desarmada com que se entregam ao palco da vida. Robbie Williams pertence a esse segundo grupo, não porque tenha a pretensão de eternizar-se, mas justamente por aceitar, sem cerimônias, a efemeridade de tudo — inclusive de si mesmo. Seu grito por amor e aceitação, encapsulado em versos como “I just wanna feel real love,” carrega o peso de uma existência costurada por tensões internas, desilusões e buscas que, longe de serem resolvidas, permanecem em constante estado de inquietação. Tal angústia existencial não apenas alimenta sua arte, mas constitui a matéria-prima de uma narrativa que se recusa ao conforto da estabilidade. “Better Man” transforma essa inquietação em linguagem cinematográfica, ousando não explicar, mas fazer sentir.

Michael Gracey, ao dirigir essa releitura da vida de Williams, não opta pela cronologia didática das cinebiografias usuais. Prefere, ao contrário, subverter a forma, lançando mão de uma estética ousada e quase surrealista: Robbie é representado como um primata — um ser que ainda não alcançou, e talvez jamais alcance, a plena condição humana. Não se trata de uma metáfora simplória, mas de uma provocação à própria ideia de evolução pessoal, tão cara à indústria da fama. A cada passo, a figura do homem-macaco questiona o que significa amadurecer, quando o sucesso, longe de apaziguar, intensifica as fraturas psíquicas que remontam à infância. O abandono paterno, que abre o filme, já sugere que qualquer busca por aprovação estará fadada à frustração. É nesse vácuo afetivo que floresce a persona rebelde e vulnerável de Williams.

A narrativa, pontuada por canções como “Come Undone” e “Feel”, não se contenta com o desfile de eventos biográficos. Há uma urgência em compreender o que há por trás do brilho ofuscante das turnês e discos de platina. Williams, narrador de si mesmo, interfere nas imagens como quem deseja, afinal, manter certo controle sobre sua própria história — ou ao menos sobre como ela será lembrada. Entre o Take That e sua carreira solo, entre o abuso e a redenção, entre os amores perdidos e os desafetos lendários, o que emerge é a figura de um artista que recusa a narrativa de superação fácil. Ser melhor, para ele, não é vencer, mas aceitar os pedaços que sobraram, moldando-os como puder. Há beleza, e também ironia, nesse modo de existir: o homem que não consegue ser quem esperam, mas que canta com paixão visceral sobre esse fracasso.

A escolha por retratá-lo em permanente descompasso com o ideal de celebridade ajustada aproxima “Better Man” de outras incursões cinematográficas sobre figuras icônicas, como Freddie Mercury, Elton John e Whitney Houston. No entanto, ao invés de celebrar o mito, Gracey insiste em desnudá-lo. A semelhança entre os filmes está na tentativa de explorar o abismo entre o palco e o bastidor, mas aqui, o bastidor não é apenas o lugar das fraquezas humanas — é o território onde o artista verdadeiramente se revela. O momento final, em que Williams canta “My Way”, destila esse espírito: longe de ser uma apoteose, é um gesto de aceitação, não da grandiosidade de sua trajetória, mas da simplicidade de ter vivido à sua maneira, mesmo quando essa maneira era imperfeita, dolorosa e cheia de tropeços. E é por isso, não apesar disso, que ele se mantém digno de ser ouvido — e, mais ainda, de ser sentido.

Filme: A Better Man — A História de Robbie Williams
Diretor: Michael Gracey
Ano: 2024
Gênero: Biografia/Drama/Fantasia/Musical
Avaliação: 10/10 1 1
★★★★★★★★★★