Comédia com Jane Fonda e Diane Keaton é receita de leveza e bom humor na Netflix Divulgação / Focus Features

Comédia com Jane Fonda e Diane Keaton é receita de leveza e bom humor na Netflix

Alguns filmes não se interessam em contar uma história; eles preferem apenas circular por ela, com a leveza de quem evita o peso do enredo em nome de uma atmosfera agradável. “Do Jeito Que Elas Querem 2: O Próximo Capítulo” escolhe justamente esse caminho: menos uma continuação narrativa, mais uma oportunidade de reencontrar quatro rostos conhecidos em um cenário ensolarado, onde cada ruela de paralelepípedo parece ter sido escolhida por um catálogo de turismo. A Itália não serve aqui como cenário, mas como desculpa  — e o roteiro, ciente disso, se acomoda confortavelmente entre taças de vinho e gargalhadas ensaiadas.

O pretexto para a viagem é o anúncio do casamento de Vivian (Jane Fonda), que impulsiona as amigas rumo a uma espécie de despedida de solteira geracional, marcada menos por descobertas e mais por selfies mentais diante de pontos turísticos célebres. Roma, Veneza e Toscana funcionam como cartões-postais ambulantes, enquanto o filme evita deliberadamente qualquer atrito narrativo, apostando que o carisma do elenco veterano e a indulgência do público bastarão para sustentar a experiência.

No começo da história, há um ritmo promissor, embalado pelo reencontro das personagens e pela sugestão de que algo poderá se desenvolver dali. Mas à medida que a trama avança, as situações propostas oscilam entre o banal e o implausível, como se a história fosse escrita durante a viagem, ao sabor de capuccinos e improvisos. Um vestido que transforma Diane em abajur, um furto de malas que parece esboçado por roteiristas distraídos e uma série de imprevistos tão forçados quanto a ausência seletiva de sinal de celular. O filme ri de si mesmo, mas sem a autocrítica necessária para transformar isso em qualidade.

Mas não se engane, há lampejos de vitalidade. Mary Steenburgen e, sobretudo, Candice Bergen são as que melhor compreendem o jogo farsesco proposto. Bergen, com seu sarcasmo afiado e seu olhar de quem se diverte mais do que atua, injeta uma energia cômica que quase redime o conjunto. Já Fonda, cada vez mais enrijecida pela mitologia de si própria, parece mais preocupada em sustentar um ícone do que em habitar uma personagem. E Diane Keaton, como tem feito há décadas, repete sua persona consagrada com pequenas variações, navegando com segurança em águas mornas.

A ausência de conflito real é mascarada por paisagens tão bem enquadradas que poderiam estar em um comercial de perfume. A fotografia insiste em transformar cada esquina de Roma num suspiro visual, cada vinhedo toscano numa promessa de serenidade. Mas essa beleza ostensiva cobra um preço: o conteúdo se dilui diante da forma. Resta a impressão de que se tratava menos de um roteiro e mais de um itinerário  — cuidadosamente planejado para agradar ao olhar, mas incapaz de alimentar qualquer ambição dramática.

A leveza, nesse caso, não é uma escolha estética, mas uma fuga. O filme não lida com a passagem do tempo, com a solidão, com a perda, com a complexidade real das relações entre mulheres que envelhecem diante das câmeras. Tudo se resolve com um brinde, uma dança improvisada, uma troca de olhares cúmplice sob o pôr do sol. Há algo quase cínico nessa negação em lidar com o peso dos anos: a velhice aqui é tratada como uma comédia romântica de meia-idade que se recusa a sair do paraíso.

E mesmo assim, há um tipo de fascínio residual. Não exatamente pelo que o filme é, mas pelo que evoca. Ver essas atrizes envelhecendo em público  — com rugas bem comportadas e sorrisos disciplinados — tem algo de antropológico. É como observar uma geração tentando reencenar a juventude com as armas do passado: charme, leveza, improviso. O resultado não é exatamente cinema, mas também não chega a ser apenas marketing disfarçado. É um híbrido curioso: parte fantasia escapista, parte registro melancólico daquilo que o tempo não perdoa, mas o roteiro insiste em maquiar.

A promessa de uma grande revelação final  — o casamento secreto que fecha a viagem  — se dissolve na previsibilidade de uma cerimônia improvisada e desajeitada, onde até a ausência de um padre vira piada reciclada. É o tipo de desfecho que se contenta em acenar para o público com um sorriso, sem se preocupar se a história chegou a algum lugar. Afinal, quando as locações são belas o suficiente, quem se importa com o destino?

“Do Jeito Que Elas Querem 2” é, no fundo, uma espécie de álbum de memórias turísticas com orçamento generoso e roteiro esquelético. Não exige muito, mas também não oferece. É feito sob medida para quem deseja apenas reencontrar rostos familiares e se deixar levar por paisagens encantadoras, mesmo que isso custe a substância. E talvez haja nisso uma honestidade discreta: o filme nunca prometeu mais do que entregou. Ele apenas sorri, acena, e convida o espectador para mais uma taça de prosecco à sombra de um vinhedo que, de tão perfeito, quase nos faz esquecer que não houve história ali  — só paisagem.

Filme: Do Jeito Que Elas Querem
Diretor: Bill Holderman
Ano: 2023
Gênero: Comédia/Romance
Avaliação: 7/10 1 1
★★★★★★★★★★