Você sabe qual foi a primeira comédia original da Netflix a conquistar o Top 1 mundial em mais de 100 países? Divulgação / Netflix

Você sabe qual foi a primeira comédia original da Netflix a conquistar o Top 1 mundial em mais de 100 países?

“Megarrromântico” abusa da metalinguagem, e nem poderia ser de outro modo. Essa crítica bem-elaborada sobre um tópico bastante específico do cinema, visando a um assunto de que todos, em maior ou menor grau, entendemos bem, pega em cheio qualquer público, a despeito de idade, condição social, etnia, credo ou preferências na cama, e de alguma forma, Todd Strauss-Schulson inclui um pouco de cada uma dessas categorias em seu pitoresco retrato de como seria a viver numa bolha rosicler, sem espaço para as lágrimas furtivas ou convulsas das desilusões amorosas, tampouco para corações gelados ou a solidão inclemente dos amantes desesperançosos. O roteiro de Erin Cardillo, Dana Fox e Katie Silberman fala de uma mulher fora dos padrões que rejeita com veemência qualquer vestígio de romance, tanto pior se aqueles envoltos por uma grossa camada de açúcar colorido. A atmosfera de adorável ranzinzice que permeia a hora e meia de enredo sustenta-se quase inteira sobre o cativante desempenho de uma protagonista aplicada, disposta a atropelar o máximo de clichês que consegue com toda a galhardia.

Natalie, uma arquiteta beirando os quarenta e solteira por convicção, trabalha em meio a predadores sociais por quem se esforça para passar despercebida. Josh, seu único amigo, tem, na verdade, uma queda por ela, mas, claro, ela faz questão de não reparar, e por aí começam a se armar algumas das soluções para o conflito que Strauss-Schulson vai destrinchar na sequência, remetendo ligeiramente a “A Vida Secreta de Walter Mitty” (2013), de Ben Stiller, no realismo mágico. Concluída essa etapa, Natalie agora não mora mais no apartamento caótico de antes, e sim num palacete suspenso, com um closet espaçoso no qual guarda uma coleção de sapatos de grife que faria inveja a Imelda Marcos. E não só isso: aonde quer que vá, recende um cheiro de jasmim e baunilha, o sol sempre brilha forte, jujubas parecem brotar por entre as frestas das calçadas e “A Thousand Miles” (2001), a baladinha chiclete de Vanessa Carlton, enche o ar.

Esse deboche invencível de Natalie e depois a falsa impressão de uma felicidade exacerbada são personificados com igual esmero por Wilson, mormente depois que Blake, um jovem empresário do ramo da incorporação de imóveis, a convida para um jantar à luz de velas em seu iate e os dois vão juntos para os Hamptons, no norte de Nova York. Aqui e ali, o diretor salpica boas referências a cults que misturam as duas principais vertentes de seu trabalho, como “Uma Linda Mulher” (1990), dirigido por Garry Marshall (1934-2016); “Um Lugar Chamado Notting Hill” (1999), levado à tela por Roger Michell (1956-2021); e “De Repente 30” (2004), de Gary Winick (1961-2011), sem esquecer, por óbvio, de “Feitiço do Tempo” (1993), de Harold Ramis (1944-2014), talvez definitivo quanto ao tema da quebra da rigidez cronológica. Malgrado farsescas, as declarações de amor do desfecho arrancam suspiros, e muito antes, as boas piadas, ditas com desassombro por Natalie, podem fazer molharem as calças os mais suscetíveis a emoções abruptas. E tudo isso é o amor.


Filme: Megarrromântico
Direção: Todd Strauss-Schulson
Ano: 2019
Gêneros: Comédia/Romance
Nota: 8/10