Indicado a 294 prêmios e vencedor de 6 Oscars, obra-prima da ficção científica foi vista por 50 milhões nos cinemas, no Prime Video Divulgação / Warner Bros. Pictures

Indicado a 294 prêmios e vencedor de 6 Oscars, obra-prima da ficção científica foi vista por 50 milhões nos cinemas, no Prime Video

No ano de 10191 d.C., a derrocada do duque Shaddam IV, interpretado por José Ferrer (1912-1992) em “Duna” (1984), sob a direção de David Lynch, parece refletir a trajetória de Saddam Hussein (1937-2006), o tirano iraquiano que acabou em ruínas com a intervenção dos EUA sob George W. Bush (2001-2009). A analogia, porém, ganha uma dimensão maior: se no caso de Hussein há pouco a ser preservado do que restou da Terra, em “Duna” a narrativa aborda questões universais de decadência e poder.

A obra de ficção científica, fruto da mente visionária de Frank Herbert (1920-1986) e publicada entre 1965 e 1985, rapidamente alcançou status de cult, inclusive nas telas do cinema. Com a versão original de Lynch e a releitura de Denis Villeneuve, um dos cineastas mais sofisticados da nova geração, o público é convidado a revisitar Arrakis — um planeta árido, com tonalidades avermelhadas que lembram Marte. Nesse mundo desolado, as especiarias representam a única riqueza, protegida ferozmente por colossais vermes que reagem com violência ao menor sinal de ruído.

Villeneuve, naturalmente, utiliza uma vasta gama de recursos tecnológicos para reavivar o interesse por uma história que, à primeira vista, pode parecer ultrapassada. Contudo, as mensagens implícitas revelam paralelos desconfortáveis com a realidade de quatro décadas atrás. A população de Arrakis é dominada por forças brutais que extraem tudo o que podem de suas riquezas, sem que surja qualquer resistência significativa. Isso até Paul Atreides, filho de Shaddam IV, emergir como o líder que desafiará os opressores fremen, assumindo o papel de messias para o povo subjugado.

O crescimento artístico de Timothée Chalamet é notável. Em 1984, o roteiro permitia uma liberdade criativa a Kyle MacLachlan, mas agora, sob a batuta de Villeneuve, Eric Roth e Jon Spaihts, Chalamet é quem brilha. Ele aproveita cada oportunidade para convencer o público de que “Duna” ainda merece atenção. Seu Paul, um jovem inicialmente protegido e distante das adversidades, precisa assumir as responsabilidades de seu pai, o duque Leto, interpretado por Oscar Isaac. Leto, apesar de ser um governante respeitado, encontra-se enfraquecido frente à ameaça crescente dos inimigos, de onde se desenrola uma trama romântica envolvendo Chani, personagem de Zendaya.

A nova abordagem de Villeneuve mantém o ritmo ao trazer à tona a jornada de amadurecimento forçado de Paul, ainda que ele economize em cenas de monstros subterrâneos emergindo para a superfície. O destaque recai sobre o desenvolvimento de Paul, e Chalamet se destaca ao interpretar esse personagem que atravessa uma transformação radical. A narrativa se desenrola de maneira que deixa claro que Paul está se preparando para um desafio maior, tanto na história quanto na vida real de Chalamet, refletida na transição que ocorrerá no segundo filme.

Villeneuve habilmente evita comparações diretas com o trabalho peculiar de Lynch, mantendo um foco mais equilibrado nas cenas de batalha e nos desafios emocionais de Paul. As ofensivas dos invasores, pilotando suas naves tópteros, são abordadas com cautela, e Paul não reage de forma violenta a todas as provocações, sugerindo que seu crescimento como líder está longe de terminar. A última cena promete uma evolução de Paul, que, possivelmente, deixará de ser tão racional e encontrará prazer no combate com espada, algo que deve ser explorado em “Duna 2”, também dirigido por Villeneuve, cuja estreia está marcada para o dia 29 de fevereiro.


Filme: Duna
Direção: Denis Villeneuve
Ano: 2021
Gêneros: Ficção científica/Aventura
Nota: 9/10