Adão foi o primeiro. Mordeu-me a maçã do rosto. Então, quebrei-lhe as costelas que ainda restavam usando o mesmo fórceps com que fui extirpada do seu tórax de macho alfa-dominante. Por justa causa — eu reconheço — fomos expulsos do Paraíso (Motel Paraíso, 666 Jardim do Éden — Cidade do Pecado). Não seja besta. Numerologia não me assusta. Babaquice, sim. Começava ali a minha saga em busca de um amor que valesse a pena. Eu não me dispunha a ser uma espécie de mulher objeto, sujeita a homens abjetos que me colocassem num pedestal, numa estante ou para desfilar montada numa glande. Eu cagava pra eles. Daquele dia em diante, ao invés de ser caça, quem caçava era eu.
Ayrton, por exemplo, era um sonhador, do jeito que eu gostava. Aos domingos, pilotava foguetes para Marte, adorava as minhas curvas, a minha entrega, a minha arte. Vangloriava-se em dizer que dirigia muito melhor quando a pista estava molhada. Então, tascava-me uma chuva de beijos, sem medo de derrapar sobre as estrelas da Via Láctea. Arquimedes, além de cético, era pragmático, não entendia nada de poesia, duvidava que os nossos corpos pudessem ocupar ao mesmo tempo o mesmo lugar no espaço. Nunca fui boa em ciências exatas, então, exatamente por isso, por divagar depressa nas emoções, eu não abria mão dos eufemismos, nem de tripudiar sobre os homens destituídos de sensibilidade e tutano: transbordei fora daquele relacionamento.
Cristóvão veio com a seguinte falácia: se tinha descoberto a América, seria moleza descobrir, aportar no meu Ponto G. Eu não concebia possuir uma cartilha para otários entre as coxas. Aliás, sob estímulos cuidadosos, cada centímetro da minha pele urraria até ficar rouco. Rapidamente, saquei que o sujeito era uma espécie de aventureiro, um analfabeto afetivo que não conseguiria colocar sequer um de seus ovos em pé sobre a mesa. Vazei. Deixei-o à deriva num mar de lágrimas. Cabe aqui um adendo. Aliás, vou além disso, farei uma advertência: Senhores do Ministério, eu faço mal à saúde dos calhordas. Os homens fúteis, quando caem por mim, choram até desidratar. Eu não me importo, não sou a mãe deles. Eu sou uma mulher simples que se alimenta de amor e carinho. É só isso.
E por falar em fome e sede, dei a Cesar o que não era de Cesar, então, ele retribuiu tocando fogo na cama. Oferecia-me denários de prata em rituais de idolatria. Confesso que achava aquilo um exagero. Ele pensava que eu fosse uma espécie de deusa em busca de reconhecimento. Não, eu não era. Eu era uma mulher cheia de caminhos. Bastava que ele me olhasse com cuidado no espelho para perceber que algum deles o conduziria ao amor, embora nunca o levasse a Roma. Tudo era uma questão de reflexo e ótica. Se tivesse um coração para ler, que lesse.
Nem me lembre! Para mim, Elvis já tinha morrido fazia tempo. De todos os amantes que tive — aposto que foram 12 — Judas foi o que menos me traiu. Não sei por que ele tinha que se enforcar em dívidas. Quem sentia remorsos era eu. Certa feita, namorei um roqueiro baiano. Eu pedia: “Toca, Raul!”. Daí ele tocava uma pra mim. Pode parecer meio teatral, meio dramático: eu tomava vinho; Romeu, cicuta. Era um tipo de amor que não podia dar certo.
Sócrates foi um namorado culto, inteligente, um verdadeiro sábio que passava a vida a pensar, fatigando os neurônios ao analisar o comportamento humano. Certa noite, sob as estrelas, enquanto acendíamos vagalumes com fagulhas-de-olhar, perguntei se o nosso amor duraria para sempre, mas ele fez assim com os ombros e disse que só sabia que nada sabia. Achei aquilo o máximo. Beijei-o com ternura e fé. Eu gostava de homens mais velhos. Depois de Vinícius — que me amou eternamente até o último sarau de poesia em Copacabana — foi o amante mais atento que já pisou meu coração.