Uma dose de originalidade, por favor!

Uma dose de originalidade, por favor!

Às vezes tenho a pretensão de achar que eu já senti tudo o que tinha pra sentir nessa vida, seja de bom ou de ruim. Fico pensando que nada mais vai me surpreender e o que vier será uma versão modesta do que foi um dia. Eu sei, soa imaturo e presunçoso, mesmo com a certeza de que há tanto por viver e lugares a conhecer, gente que vai entrar e sair do meu mundo como se ele fosse uma sala de espera de um consultório médico.

Não me leve a mal. Não é pessimismo meu, é só desânimo mesmo. Eu acredito que a culpa deve ser desse exército de pessoas que insistem em se parecer umas às outras, falando sempre as mesmas coisas de um jeito tão presumível quanto a programação de domingo na TV. Nada contra, mas… Por onde andam os imprevisíveis, os românticos incuráveis e declarados, os boêmios gaiatos, anedóticos de piadas impróprias, cidadãos do contra, almas às avessas?

De repente sou eu a inconformada que se entedia com essa uniformidade explícita e sem-vergonha. Aliás, ninguém tem vergonha de ser mediano.

E eu com isso? Na verdade, nada. Só me dei conta de que pessoas incomuns estão caminhando para a extinção, e que a farta maioria se transformou em uma espécie de “indivíduos formulários”, classificados com as mesmas palavras-chave, genéricos por livre e espontânea vontade. É por essa razão que me enfado com o papo furado de velhos assuntos clichês, gente que quer agradar com suas respostas fofas e perguntas óbvias. Nesse porre de mesmice meu consciente sai pela culatra e berra em desespero: Uma dose de originalidade, por favor!

É por isso que o fascínio me toma quando vejo gente colorida circulando num mundo em preto e branco. Me ascendo, me arrebato, me encanto. Tenho vontade de cantar sem me importar se desafino, e falar compulsivamente sobre a imensidão de coisas não óbvias! Quero virar a madrugada viajando em conversas profundas e despretensiosamente divertidas, sem pudor gritar pela janela: Achei! Achei alguém nesse mundo a me completar!

É isso que me faz feliz! Encontrar meus semelhantes e junto deles me reconhecer, porque esses encontros mágicos fazem parte dos mistérios que dão sentido à vida, que nos tiram da mesmice insossa no momento em que alguém chega e acende as luzes da casa, como se fosse dia de festa! Quando almas afins se unem, parece que um carnaval baixa dos céus e se apossa dos corações parecidos!

É isso que está me faltando. É disso que estou falando: a emoção do encontro com os meus! Juntos vamos pintar de cores vivas as paredes pastéis das nossas casas!

Cada semelhante que esbarro nas esquinas eu vou colhendo feito tesouro, com a esperança de que seremos ainda um batalhão de apaixonados, festivos, espirituosos, sensíveis, burlescos, românticos e acreditados no bem, na vida e no amor! Numa madrugada sairemos às ruas com toda a nossa pluralidade, às gargalhadas e às cantorias, colorindo a noite com músicas de outros tempos, essas que os jovens nunca ouviram falar e que provavelmente nos repudiarão de cara. Mas a nossa alegria sincera será tão extraordinária, que os corações mais cegos se renderão à beleza de quem não tem margem!

Eu tenho fé e esperança de que nós, pessoas feitas de livros, roteiros e música boa, seremos maiores que a falta de graça do exército dos formulários!

Karen Curi

é jornalista.