Livro explica as manias ou métodos de trabalho de escritores famosos, como Joyce, Fitzgerald, Roth e Alice Munro
No livro “Rituales Cotidianos — Como Trabajan los Artistas” (Turner, 264 páginas), Mason Currey registra as manias ou hábitos de trabalho de mais de 160 criadores célebres. O jornal “ABC”, de Madri, arrola, no texto “Las manías de los grandes escritores”, o que chama de “manias” de dez prosadores. O livro, inédito no Brasil, explica como os escritores, de James Joyce a Philip Roth, escreveram suas obras-primas.
F. Scott Fitzgerald
(1896-1940)
Alcoólatra inveterado, não se sabe como Scott Fitzgerald arranjava tempo para escrever romances e contos de alta qualidade. I. Martín Rodrigo, do “ABC”, diz que o autor do romance “O Grande Gatsby” não tinha um horário normal. Em Paris, em 1925, levantava-se às 11 e começava a escrever às 17 horas. Seguia escrevendo pela madrugada. O jornal ressalva que o escritor americano e sua mulher, Zelda, passavam muitas noites nos cafés. “Sua verdadeira escritura se dava em breves momentos de atividade concentrada” — este, quem sabe, seu segredo. Escrevia, às vezes, 8 mil palavras numa sentada. “O problema é que o autor” de “Suave é a Noite”, romance levado ao cinema, “foi pouco a pouco convencendo-se de que o álcool era essencial para seu processo criativo”. Adorava gim.
Arthur Miller
(1915-2005)
“Oxalá eu tivesse uma rotina para escrever”, disse Arthur Miller. O autor de “A Morte de um Caixeiro-Viajante” dizia que se levantava cedo, escrevia em seu escritório e, depois, destruía tudo. Ocasionalmente, algo do que havia escrito, de um jato, “sobrevivia”. “A única imagem que vem à mente é a de um homem que caminha com um pedaço de ferro numa mão durante uma tempestade de raios”, sugeriu o escritor. Um dos maiores dramaturgos norte-americanos, Miller se tornou mais popular devido ao relacionamento com Marilyn Monroe. Não é uma estrela como a atriz, mas, culturalmente, está quilômetros adiante.
Haruki Murakami
(Kioto, 1949)
Murakami pode não ser um escritor do porte de Yukio Mishima e Yasunari Kawabata, mas está se tornando o Roberto Bolaño do Japão, e não só do país asiático. É uma estrela. Ele acorda às 4 horas e, quando está escrevendo um livro, “trabalha de cinco a seis horas seguidas”. Na parte da tarde, “o escritor japonês nada, corre, lê, escuta música”. Dorme por volta de 21 horas. “Murakami admite que manter este ritual durante o tempo necessário para terminar um romance requer algo mais do que disciplina mental.” No período em que está concentrado, escrevendo livros, deixa de lado sua vida social. “As pessoas ficam ofendidas quando rechaço repetidamente seus convites.”
James Joyce
(1882-1941)
O autor de “Dublinenses” e “Finnegans Wake” não acordava muito cedo. Ele escrevia à tarde, período, dizia, em que “a mente está em seu melhor momento” (a frase é de sua autoria). O irlandês passava as noites em cafés e restaurantes. “Com frequência amanhecia cantando velhas canções irlandesas” em algum bar. Ele se “orgulhava de sua voz de tenor”. “Em 1914, quando já havia começado a escrever ‘Ulysses’, trabalhava” na elaboração do “livro todos os dias”. Mas seguia escrevendo apenas à tarde e, à noite, confraternizava com os amigos Em outubro de 1921, depois de sete anos de trabalho, terminou o romance. “Calculo que devo ter passado quase 20.000 horas escrevendo ‘Ulysses’”, revelou.
Henry James
(1843-1916)
Autor de “As Asas da Pomba” e “Retrato de uma Senhora”, Henry James “sempre manteve hábitos de trabalho regulares. Escrevia todos os dias”. Ele começava a escrever de manhã e só parava no horário do almoço. Nos últimos anos, com dores na mão com a qual escrevia, passou a ditar os textos a um secretário. “Na parte da tarde, lia, tomava chá, passeava, ceava; e passava a noite tomando notas para o trabalho do dia seguinte.” Assim que terminava um livro começava outro imediatamente — daí sua grande produção como prosador e crítico literário.
Truman Capote
(1924-1984)
O autor do romance “A Sangue Frio”, um clássico da literatura de não-ficção, “escrevia quatro horas por dia”. O norte-americano Truman Capote “revisava sua obra à noite ou na manhã seguinte e fazia duas versões manuscritas, a lápis, antes de datilografar uma cópia definitiva. Era muito supersticioso. Escrever na cama era a menor de suas superstições. Não colocava no mesmo cinzeiro três bitucas de cigarro. Se estava visitando alguém, colocava os restos dos cigarros em seus bolsos para não encher o cinzeiro. Na sexta-feira não podia começar nem terminar nada e somava números em sua cabeça de modo compulsivo”, relata o “ABC”.
Martin Amis
(Swansea, 1949)
Autor de “Casa de Encontros” (sobre o Gulag soviético) e “Lionel Asbo — Estado da Inglaterra”, “Martin Amis escreve de segunda a sexta-feira em um escritório a pouco mais de um quilômetro de seu domicílio londrino”. Fica o tempo todo no escritório, mas não escreve o tempo inteiro. “Todo mundo supõe que sou uma pessoa sistemática (…). Creio que a maioria dos escritores se sentiria muito feliz com duas horas de trabalho concentrado”, afirma o prosador inglês.
Philip Roth
(Newark, 1933)
“Escrever não é um trabalho duro — é um pesadelo”, declarou, em 1987, Philip Roth, um dos mais prolíficos escritores americanos e discípulo de Saul Bellow. “Em 1972 mudou-se para uma casa do século 18, numa área rural, em Connecticut. Usa como escritório uma antiga casa de hóspedes, onde começa a trabalhar depois do café da manhã e de fazer algum exercício” (é excelente nadador). “Escrevo das 10 horas até as 18 horas todos os dias, com uma folga de uma hora para almoçar e ler jornais. À noite, só leio.” A informação ficou datada. O autor dos romances “O Complexo de Portnoy” e “O Teatro de Sabbath” disse adeus à literatura. Inclusive deu autorização para um especialista biografá-lo, sugerindo que concluiu sua “carreira” de escritor.
Jonathan Franzen
(Chicago, 1959)
Um dos autores preferidos do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, o autor de “Liberdade” está frequentemente na lista dos best-sellers dos principais jornais norte-americanos. “Em 2001, enquanto trabalhava” no romance ‘“Relações’, Jonathan Franzen se fechava em seu escritório, no Harlem, com as luzes apagadas e as persianas abaixadas, sentado em frente ao computador, com tampões nos ouvidos e com os olhos vendados. Demorou quatro anos para concluir o romance e descartou milhares de páginas. “Passava o dia escrevendo e burilando, até que às 16 horas não tinha mais remédio do que admitir que” o material “era ruim. Entre 17 e 18 horas, me embebedava com copos de vodka. Depois, ceava, altas horas da noite, consumido por uma enfermiça sensação de fracasso. Odiava a mim mesmo todo o tempo”, diz o cultuado Franzen.
Alice Munro
(Wingham, 1931)
O “ABC” registra que, “na década de 1950, Alice Munro, mãe e dona de casa, só podia escrever quando suas tarefas domésticas o permitiam”. Assim, escrevia à tarde, “aproveitando que sua filha pequena dormia e a maior estava na escola. No início de 1960, a prêmio Nobel de Literatura alugou um escritório, em cima de uma farmácia, para escrever, mas o deixou depois de quatro meses devido ao senhorio, que, muito chato, a interrompia frequentemente.” Aos 82 anos, Munro, uma das maiores prosadoras canadenses, quase uma Tchekhov de saia, anunciou que não vai mais publicar. Vale a pena ler os contos das obras-primas “O Amor de Uma Boa Mulher” e “Vida Querida”.